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O que Abrahão representou

Nona videoconferência de uma série

sobre temas diversos das Doutrinas Celestes

 

Desde o início do passado, temos tido a oportunidade de estudar em nossos encontros vários assuntos relacionados direta ou indiretamente às obras de Swedenborg. Entre outros temas, abordamos aqui a história da criação relatada no livro de Gênesis, e continuamos com a história da criação do homem e da mulher, o jardim do Éden, Cain e Abel, o dilúvio e a torre de Babel. Vimos como todos esses relatos, que vão até o décimo primeiro capítulo de Gênesis, são como parábolas, ou histórias moldadas em tipos representativos de forma a falar de outra dimensão, a espiritual. Vimos como muitas coisas nesses capítulos iniciais da Bíblia não podem ser compreendidas como verdades literais, pois são como vasos para conter verdades espirituais.

Não faz mal se a pessoa, em sua simplicidade de crença, entende esses relatos literalmente, mas, conforme amadurece e reflete, ela pode concluir que nessas histórias deve haver um significado interior.

De fato, como vimos, existe um outro sentido, oculto, nos relatos literais de Gênesis e demais livros das Escrituras Santas, mas esse sentido ficou vedado ao conhecimento humano por séculos, até quando aprouve o Senhor Jesus Cristo abrir os selos da Palavra e revelar à igreja o sentido espiritual da Palavra, e isto é o que se entende pelo Segundo Advento do Senhor, agora em Espírito, na Sua Palavra.

É assim que ficamos sabendo, por exemplo, a história da criação do universo significa a história da regeneração espiritual ou do novo nascimento do homem. O céu significa o seu homem interno; a terra é o homem externo, ou a mente natural, onde está sua vida consciente. As águas separadas são duas classes de verdades de sua instrução; as plantas, os répteis, os animais e as aves significam todas as ideias e afeições que são produzidas pelo homem nesse processo de reforma e regeneração, por obra da Misericórdia Divina.

E assim é o caso com todas as demais coisas relatadas no livro de Gênesis, como o jardim do Éden, que significa a sabedoria do homem regenerado; a criação da mulher, que representa o eu ou proprium de cada um, que é essa sensação de que a vida está dentro de nós, e não vem do Divino, como de fato é o caso.

A história de Cain e Abel trata de quando surge antagonismo entre a fé e a caridade na igreja. Quando a fé tem supremacia, ela anula a caridade. O dilúvio é inundação de falsidades que assolou a humanidade que se afastou do Criador. A arca, com seus três andares e todos os animais, imundos e limpos, é a mente do homem com todas as suas afeições, apetites e prazeres, bons e maus, que foi reestruturada após o tempo antiquíssimo. E a torre de Babel é a elevação da soberba da raça humana, que quis e ainda hoje quer se elevar à luz da sabedoria, como se não houvesse um Deus Criador nem uma Lei Divina.

E então chegamos ao capítulo 11 de Gênesis e entramos em outro nível de relatos. Porque agora se trata de fatos históricos, eventos e pessoas reais, e não mais meras alegorias, como nos capítulos precedentes. Mesmo assim, apesar de serem relatos historicamente reais, tudo ali está descrito de tal forma que ainda representa a realidade espiritual e sempre trata, no sentido interno, do Senhor, do céu, da igreja e do homem.

As pessoas citadas, como Abrahão, Sarah, Loth, Hagar, Isaque etc., foram indivíduos reais, mas, em todas as situações e falas descritas, elas eram como que personagens de um drama celeste; estavam representando – sem que o soubessem – situações da realidade espiritual.

No nível mais elevado, trata-se do processo de glorificação do Humano do Senhor, isto é, como o Divino Ser, Jehovah, entrou no mundo, no tempo e no espaço, e como a Alma Divina, Se revestiu de um Humano formado no corpo de Maria, e, depois, como a Essência Divina foi gradativamente purificando a essência Humana e fazendo-a também Divina. O Divino, nos íntimos, ou a Alma, instruía o Humano no externo, ao mesmo tempo que purgava daquele humano as fraquezas herdadas da hereditariedade materna. Esse processo de purificação e consequente união ocorreu sucessivas vezes, cada vez mais ampla e intimamente, até que, no final do processo, a hereditariedade materna foi inteiramente expelida, e o Divino fez um com o Humano, tornando-Se Um só Ser, Divino e Humano, como o Senhor diz: “Eu e o Pai somos um”.

Esse processo todo aconteceu e se completou, de fato, quando o Senhor desceu a este mundo, há aproximadamente dois mil anos. Mas todas as etapas e situações desse processo foram prefigurada desde a antiguidade, por tipos simbólicos, desde uma era muito antiga, mas especialmente por volta de 1.500 anos antes de Cristo, na história de Abrahão.

Tudo começa com a história do pai de Abrahão, Therach, e de seus irmãos. Eles viviam em Ur, na Caldeia, até que Therach toma sua família e vem para Canaan, mas se detém em Charan. E então, no capítulo 12, lemos que o Senhor Jehovah fala a Abrahão, que nessa época ainda se chamava Abrão, para ele deixar a casa do pai e se dirigir para uma terra que lhe seria mostrada, e lhe promete muitas bênçãos. Abrão obedece a voz Divina; toma Sarai, sua esposa, e seu sobrinho, Loth, e vem para a terra de Canaan, que era a terra que Deus disse que lhe daria.

Abrão anda mais para o sul e chega até o Egito. Ali, o faraó cobiça Sarai, por ser mulher muito formosa. Abrão, achando que corria perigo de vida, diz que Sarai é sua irmã, e não esposa. E, de fato, Sarai era sua meia-irmã, por parte de pai. Mas o Senhor feriu o faraó por causa dessa cobiça e o faraó, para reparar seu erro, indeniza Abrão. Este retorna do Egito, agora trazendo grande riqueza em ouro, prata e rebanho. E vem com ele seu sobrinho, Loth, que também tinha acumulado riqueza. Mas eles tinham acumulado muito gado, de modo que os pastores de ambos contendiam entre si. Então Abrão e Loth se separam. Loth escolhe ficar na fértil planície do Jordão, até a cidade de Sodoma, enquanto Abrão vai para o outro lado, Hebron, onde edifica um altar ao Senhor. E, depois dessa separação, o Senhor fala novamente a Abrão e lhe promete que lhe nasceria um filho e renova a promessa da terra a ele e à sua descendência.

Por aquele tempo, aconteceu certa batalha entre nove reis, quatro contra cinco. Uns reis havia sido subjugados a outros durante 13 anos, mas no 14º ano eles se rebelaram e fizeram guerra ao outro grupo. Nessa guerra, Loth acabou sendo cativo. Abrão então reúne os seus servos e persegue os rebeldes até Dan, livrando Loth. Após essa vitória, vem ao encontro de Abrão o rei de Salém que era também sacerdote, Melquisedeque, ao qual Abrão oferece o dízimo.

Mais adiante na história, Sarai, a esposa de Abrão, vendo que eram ambos idosos e ela era estéril, toma a sua serva egípcia, Hagar, e dá a Abrão, para que pela serva eles tivessem um filho. Então nasce Ismael. Mais tarde, o Senhor cumpre a promessa feita a Abrão, e Sarah tem seu único filho, Isaque.

Bom, isto é um breve resumo de pouco mais de quatro capítulos de Gênesis sobre Abrão, mas a história prossegue por mais nove capítulos, até a morte de Abrão, no capítulo 25. Já então seu nome tinha sido mudado para Abrahão, pois o Senhor acrescentou ao seu nome a letra “he”, tirada do nome de Jehovah.

Nós não iremos avançar além deste ponto no relato histórico; ficaremos só com essa parte inicial, que é bastante para demonstrar como é o sentido interno, o que cada personagem aqui representa, e como, de um modo profundamente maravilhoso, o Senhor nos está ensinando sobre Ele mesmo, a glorificação de Seu Humano e, em outro nível, as vicissitudes por que passa a igreja e, além disso, como se dá a regeneração de todo homem, quando o seu homem interno se une ao externo.

Antes de a raça humana perder seu estado original de espiritualidade, não havia necessidade da manifestação física da Divindade, pois o ser humano, representado por Adão em seu estado de integridade, tinha uma mente angélica e podia ter comunicação com Deus acima do nível natural. Mas, após a degeneração de nossa raça, caímos num nível de vida meramente corporal, e perdemos aquela capacidade de compreender Deus em espírito. Foi então que se fez necessário que o Criador descesse até o nível aonde nós humanos descemos e estamos.

As profecias do Velho Testamento prometiam, em várias épocas, que o Senhor Jehovah viria ao mundo como Redentor, que Ele seria Deus conosco, sendo chamado de Deus, menino, filho e Pai, ao mesmo tempo, a fim de não restar dúvidas de que, quando viesse, seria a mesma pessoa, o próprio Jehovah Se manifestando como Redentor e Salvador, um Deus único, de eternidade Criador, no tempo Redentor, e de eternidade Regenerador. O cristianismo de hoje perdeu essa compreensão, mas os cristãos primitivos entendiam muito bem que o próprio Deus veio ao mundo e andou entre nós, e vimos a Sua glória, pois, como Ele disse: “Quem vê a Mim, vê o Pai”, e isto porque o Pai, a Alma Divina, habita corporalmente em Jesus Cristo.

Deus está fora do tempo e do espaço, como se sabe, mas os humanos estão limitados a essas duas dimensões. Por isso, do ponto de vista humano, passaram-se milhares ou milhões de anos entre a queda do homem do jardim do Éden e a vinda do Redentor, seu nascimento em Belém. Mas, do ponto de vista Divino, Ele desceu e Se fez presente com o homem imediatamente após a queda, sem demora alguma. E a maneira como Ele Se fez presente foi pela da Palavra, porque a Palavra é Ele mesmo influindo no homem com o Divino amor e a Divina sabedoria.

Sendo assim, quando lemos os relatos da história de Abrão ou, mais tarde, Abrahão, cada detalhe ali descrito é, de fato, uma informação a respeito do cumprimento da promessa Divina, de como Ele veio ao mundo, como estava, já, presente nos símbolos e nas pessoas representados, que figuravam e antecipavam como Deus assumiria um revestimento natural, como Ele purificaria aquele corpo e o faria Divino, como Seu templo, no qual habitaria conosco. Deus Se fez carne, Se fez visível, na aparência de Jesus Cristo. Depois dessa manifestação, o Divino Eterno Se aproximou de nós, pôde ser conhecido, visto e amado, e não há outra maneira de nos aproximarmos de Deus senão na Sua manifestação visível, Jesus Cristo.

Assim, o patriarca Abrahão representa o Humano do Senhor em todas as etapas por que passou quando veio ao mundo, desde a concepção e o nascimento em Belém, passando pelo aprendizado da infância, as lutas espirituais que travou a fim de expelir as tendências nocivas do hereditário humano vindo através de Maria, até à completa finalização do processo, Ele subjugou o poder do mal e restaurou a liberdade espiritual do ser humano.

Se na história Abrão representa o humano, ou a essência humana do Senhor, quando, nos relatos, Jehovah fala com ele, isso representa a percepção que o Humano tinha oriunda de Sua Alma Divino. Era a Alma Divina influindo na mente Humana como uma percepção que a instruía. No começo, a mente humana do Senhor estava na ignorância, pois Ele quis entrar no tempo e no espaço dentro da ordem, isto é, seguindo os passos como todos os homens. E essa percepção Divina influindo na mente natural do Humano do Senhor era mais ou menos como quando nós dialogamos conosco mesmos, nosso pensamento mais interior, ou nosso juízo, nossa razão, falando com nosso pensamento mais externo. E quando Abrahão falava ou respondia a Jehovah, era o pensamento do Humano interagindo com a percepção Divina.

A ordem que o Senhor Jehovah dá a Abrão, para deixar o lugar de seu nascimento, é a instrução da Alma Divina para que o Humano se despojasse da hereditariedade humana que recebera de Maria. Abrão deixa a sua parentela e começa uma viagem para o sul, até o Egito. O Egito significa o conhecimento, a ciência, e descer ao Egito é passar por esse processo de aprendizagem por que passamos, desde a infância, de buscarmos o conhecimento dos fatos naturais.

Abrão enriquecendo no Egito representa a aquisição de conhecimentos, à medida que o Senhor aprendia e como também nós aprendemos. A diferença é que, no caso do Senhor, como a Sua paternidade era Divina, esse processo foi muito mais pleno e mais rápido, como se vê pelo fato de, aos doze anos, Ele já debater com os doutores da Lei no templo de Jerusalém.

A representação de Sarai, esposa de Abrão, ou Sarah, quando o nome de seu marido foi mudado para Abrahão, é um pouco mais complexa, porque, quando ela referida como mulher ou irmã do patriarca, ela representou os bens; mas, quando referida como esposa, representa os veros, dependendo, portanto, da relação entre a verdade e o bem, separadamente ou em conjunto, como casados. A verdade se conjunge ao bem quando se torna prática da vida.

Loth, o sobrinho de Abrão, representa o nível mais inferior da mente do Senhor, o sensual, quer dizer, o nível dos sentidos físicos, aí envolvendo prazeres, apetites e volúpias, intrinsecamente ligadas ao corpo. Esse tipo de sensação, por causa de sua fraqueza vulnerabilidade, teve de ser separado do Humano do Senhor, o que foi representado por Abrahão e Loth se separarem logo no começo da história.

Por duas vezes, quando está em reinos estrangeiros, Abrahão disse meia verdade, quando afirmou que Sarai era sua irmã, em vez de dizer que era esposa. Por causa disso, como ela era bela, o faraó, no Egito, e Abimeleque, na Fenícia, em momentos diferentes, desejaram tê-la por mulher, mas ambos foram punidos por isso, e indenizaram a Abrahão, que, estranhamente, saiu inocente.

Essa atitude do patriarca seria, sem dúvida, reprovável do ponto de vista moral, mas, no sentido interno, aprendemos que o faraó (assim como o Egito) representa os conhecimentos sem outro propósito senão o saber em si. E a cobiça de faraó por Sarai representa uma dúvida que o Humano do Senhor teve na infância, quanto aos conhecimentos naturais, se eles seriam ou não fossem pares para verdades de origem espiritual, pois os conhecimentos pareciam por si sós agradáveis ao entendimento. E a repreensão que Deus faz a faraó significa a instrução de que as verdades deviam ser aplicadas aos bens e não à satisfação do saber por si.

Algo semelhante se passou mais tarde com o rei Abimeleque, na Fenícia, mas agora esse rei representa a doutrina da fé, que vê Sarah, que aqui representa a verdade racional, não como esposa, mas como irmã de Abrão. Isso representa outra dúvida do Senhor, com relação à doutrina da fé, se ela procede do nível racional da mente ou se procede do nível celeste.

O filho que Abrão tem com Hagar, a serva egípcia, representa o primeiro racional que o Senhor teve, ainda na meninice, racional esse que é formado pelos conhecimentos (daí Hagar ser chamada serva egípcia). Mas esse racional não era genuíno, e devia ser substituído mais tarde, como de fato foi, pelo outro filho, que agora Abrão teve com Sarah, Isaque, cujo nome vem do substantivo “riso”. Esse segundo racional se origina da conjunção entre o bem e a verdade espirituais e, em nós, um segundo racional nasce quando juntamos as verdades da fé com a pratica do bem, na vida, e se chama, em nosso caso, consciência. É esse racional que será o herdeiro definitivo da herança espiritual.

Esses pormenores são apenas uma amostra muito resumida da profusão de ensinamentos espirituais que se acham encerrados nas histórias da Palavra, como tesouros que estavam enterrados e agora achamos. Para tratar somente desse simbolismo espiritual da história de Abrahão, a obra Arcanos Celestes, de Swedenborg, se estende por aproximadamente 1.200 páginas na edição inglesa. E há mais ensinamentos nos Arcanos Celestes do que qualquer pessoa é capaz de assimilar durante toda a sua vida no mundo, porque essa profusão vem da Palavra Divina, como Fonte inesgotável de sabedoria.

Minha sugestão é que nos dediquemos a conhecer cada vez clara e profundamente a Palavra de Deus, porque desse modo também nos conheceremos melhor e nos preparemos melhor para os usos que o Senhor nos destinou neste mundo.

 

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Atualização: Dezembro, 2022 - doutrinascelestes@gmail.com -