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O Juízo Final - 9

Nona videoconferência de uma série

sobre o opúsculo O Juízo Final e a Babilônia Destruída, de E. Swedenborg

 

Em nosso estudo do livro O Juízo Final e a Babilônia Destruída, viemos intercalando o estudo sobre alguns pontos fundamentais das doutrinas expostas nas demais obras de Swedenborg, pontos esses que são relacionados no livro Verdadeira Religião Cristã como os cinco singulares da fé. E vimos a cada semana que esses fundamentos são: 1) Há um só Deus em quem está a Divina Trindade, e esse Deus é o Senhor Deus Salvador Jesus Cristo; 2) A fé salvífica é crer n’Ele; 3) Os males não devem ser feitos porque são do diabo e vêm do diabo; 4) Os bens devem ser feitos porque são de Deus e vêm de Deus; 5) Os bens devem ser feitos pelo homem como por si mesmo, mas ele deve crer que é pelo Senhor que eles estão nele e são feitos por ele.

Tendo examinado cada um desses singulares em particular, só nos falta considerar o que lemos em Verdadeira Religião Cristã, como conclusão: “Os dois primeiros pertencem à fé, os dois últimos pertencem à caridade, e o quinto pertence à conjunção da caridade e da fé, assim, à conjunção do Senhor e do homem.” Isso quer dizer que os dois primeiros pontos são matérias de fé, pertencem ao conhecimento que devemos adquirir e ampliar, que há um só Deus, Jesus Cristo, e que a fé n’Ele nos salva.

Sem essas duas premissas não pode haver desenvolvimento de uma mentalidade verdadeiramente cristã, porque sem elas nega-se a união do Pai e do Filho, nega-se a união plenária da Alma Divina com o Corpo glorificado, nega-se, enfim, a Divindade do Senhor Jesus Cristo. E não somente isso, mas faz-se que seja impossível compreender o chamado “mistério” da trindade e lança-se completa escuridão em tudo o mais, tudo o que diz respeito a Deus, à vida eterna e à salvação.

Por isso o Senhor disse: “Se não crerdes que Eu sou, em vossos pecados morrereis” (João 8:24). Quando o Senhor dizia “Eu sou”, Ele Se revelava como o próprio JEHOVAH Deus, Aquele que no Antigo Testamento disse Seu nome a Moisés: “Eu sou”, “Sum Qui Sum”, “EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: SOU me enviou a vós.” (Êxodo 3:14). E no Apocalipse, novamente, Ele declara a João: “Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim, diz o Senhor, que é, e que era, e que há de vir, o Todo-poderoso.” (Apoc. 1:8).

Não poderia haver dois “Eu sou”, dois “Todo-poderoso”, mas um só Ser Divino, Criador de eternidade, que entrou no tempo e Se revestiu de um corpo Humano para se tornar Redentor, e para a eternidade é Regenerador. Esta é a única maneira de se compreender Deus, de se compreender a Trindade, que está n’Ele, e de se chegar a Ele como Deus que se pode compreender, visível, compassivo, Humano na essência mais elevada e mais pura da palavra. Esta é uma visão nova a respeito de Deus, que agora está restaurada para todos os que desejarem conhecê-lo em verdade.

Cada um que tem algum conhecimento das doutrinas do cristianismo pode julgar, mas, em minha opinião, nunca vi e parece que não há outra explicação mais clara, não há fé que eleve, exalte, enalteça a pessoa Divina do Senhor Jesus Cristo mais do que essa.

Voltando aos singulares da fé. Se é dito que os dois primeiros pontos, sobre Deus e a fé, são matérias da convicção, o terceiro e o quarto ponto, a saber, fugir dos males e fazer o bem, são matérias do viver, da ação, da caridade. Porque caridade é agir, é fazer, e a primeira coisa da caridade é deixar de fazer o mal. No exercício desses dois pontos, abster do mal e fazer o bem, a fé é posta em prática e ganha vida e corpo nas obras, e as obras são qualificadas pela fé que as motiva.

Sei que, quando falamos de obra, de ação, pode-se levantar um argumento comum do cristianismo reformado, que cita, entre outros, o livro de Gálatas 2:16: “Sabendo, porém, que o homem não é justificado pelas obras da Lei, mas pela fé de Jesus Cristo, também temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela fé de Cristo e não pelas obras da Lei, porquanto pelas obras da Lei nenhuma carne será justificada”. Sem uma reflexão mais adequada, esse versículo é o principal que vem a mente de muitos cristãos quando falamos em obra, pois foi implantada no credo cristão a ideia errônea de que a fé, sozinha, é bastante, isto é, sem que a pessoa faça coisa alguma para a sua salvação.

Por trás dessa crença está a negação do livre-arbítrio e, também, a doutrina da predestinação. Porque, quando se nega a validade da obra, nega-se, como consequência inevitável, a validade de qualquer ação que o homem possa fazer e que contribua para sua salvação. Daí vem o pensamento de que tudo é pela graça de Deus, e que o homem é como um toco ou uma pedra nas matérias da salvação. Ele é tocado pela graça sem que necessite fazer nada, e é salvo.

O dogma da predestinação, que diz que ao homem não cabe fazer coisa alguma, e que alguns são tocados pela graça de Deus, e outros não, afirma, por conseguinte, que uns foram criados para a salvação, e outros para a condenação.

Não há ideia mais injusta que se possa a ter a respeito de Deus do que essa, de que Ele tenha criado alguns de seus filhos para a felicidade eterna, e outros para sofrerem a morte eterna. Não importa o que a pessoa faça: se ela for predestinada para o céu, mesmo se viver em pecado, no último instante da vida no mundo será resgatada e salva. Enquanto a outra, por mais que se esforce para ser boa, honesta, obediente e caridosa, se foi predestinada para o inferno, para lá ela irá. E se alguém argumenta que isto é injusto e contra o amor Divino, eles respondem que não se discute a preferência que Deus possa ter dito por uns e a rejeição de outros, pois Ele é soberano.

Um dos argumentos usados pelo dogma da predestinação é a história de Caim e Abel. Os dois trouxeram de seu trabalho ofertas a Deus, mas Deus aceitou a oferta de Abel e rejeitou a de Caim, preferindo aquele e desprezando este. Usam isso para mostrar que Abel fora predestinado para a salvação, e Caim para a perdição. Mas esse arrazoado é simplesmente fruto de uma interpretação cega e literal das Escrituras. Porque Caim e Abel, assim como Adão e Eva, não foram indivíduos. Adão é uma figura simbólica, representando o ser humano (masculino e feminino) de uma dispensação antiquíssima que existiu nesta Terra. Eva, ou Vida, em hebraico, é o ser próprio desse humano. Ela representa a vida que Deus dá ao homem, ou a sensação de que a vida é própria dele. Por isso, na criação da mulher, Deus disse: “Não é bom que o homem esteja só; far-lhe ei um auxílio como se [estivesse] nele” (Gên. 2:180. A vida é como se estivesse no homem, mas não é dele, pois a única fonte de vida é Divina, a vida mesma. O homem é somente receptáculo de vida e tem a aparência de que vive por si. Então, a história do Homem e sua Vida no Jardim do Éden é a história da raça humana primordial neste planeta e a sabedoria de que desfrutava e cultivava, o jardim.

Já a história de Caim e Abel é a dessa dualidade, Fé e Caridade, naquela igreja. Caim nasce primeiro, pois a fé vem em primeiro lugar no tempo, pelo ouvir. E Abel é a caridade, a obra, que vem depois da fé, mas é a primeira em importância, pois a obra ou a caridade é o objetivo da fé. Quando, porém, as pessoas daquela igreja começaram a dar mais importância à fé, pondo a fé acima da caridade, então a crença, o intelecto, o pensamento, passaram a ter mais importância do que a ação, o viver, o amor ao próximo. E quando a fé reina, a caridade é aniquilada, representado por Caim matar Abel. E sem a caridade, a fé também é nula, porque “a fé sem as obras está morta”. Tiago 2:20”

Ora, o que Deus quer ver no homem não é tanto a crença, mas o amor ao próximo, a caridade. Vimos aqui, na semana passada, que João era o discípulo a quem Jesus amava porque João representava a caridade. Então, a oferta de Abel é a recíproca atitude do homem em relação ao Divino Amor. Deus quer e aceita a adoração quando a pessoa ama seu próximo, e não aceita a adoração se a fé é separada do viver, matéria só da crença, do pensamento.

Se não entendermos que essa história é figurada, representativa de coisas da mente, da igreja e do céu, não teremos, de fato, explicação para essa hipotética preferência de Deus por um de seus filhos e o inaceitável desprezo pela sorte de outro filho seu, e daí é que se criou o dogma da soberania e da predestinação.

Voltando, agora, à carta dos Gálatas, esse argumento poderoso para confirmar a doutrina da fé só. É suficiente uma análise cuidadosa do contexto para verificarmos que as obras a que o apóstolo se refere são as obras da Lei, isto é, as obras ritualísticas judaicas. Porque o autor, Paulo, antes ferrenho defensor da doutrina dos fariseus, ao se converter ao cristianismo, passou a maior parte do tempo instruindo e exortando as igrejas cristãs recém-formadas e que consistia basicamente de egressos do judaísmo ou gregos. Paulo insistia com eles que as obras do rito judaico do Antigo Testamento estavam agora abolidas, e que ninguém, por sua própria força, seria capaz de alcançar a salvação de sua alma somente por cumprir os estatutos do judaísmo. Ele mostrava que o Senhor veio redimir o gênero humano e trazer a salvação pela graça, não pelas obras da lei dos rituais. Eram essas as obras que não eram salvífica. Ele não falava das obras de caridade. Porque, ao invés de anular, ele exaltou o valor da caridade, o viver no amor fraternal, que era a realização da fé. E por isso escreve uma das passagens mais bonitas das cartas apostólicas, em 1 Coríntios 13, exaltando a caridade e pondo-a no primeiro plano: “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade, estas três; mas a maior destas é a caridade” (13:13).

Então, o quinto universal da fé, “E os bens devem ser feitos pelo homem como por si mesmo, mas ele deve crer que é pelo Senhor que eles estão nele e são feitos por ele” é conjunção da fé e da caridade. A fé em Deus sem a ação é uma fé morta; e ação sem uma fé que a qualifique é vazia ou meritória. Mas a conjunção entre os dois primeiros pontos e os dois seguintes está no fato de a pessoa crer que o Senhor é quem opera nela, dando-lhe tanto o querer quando o poder realizar.

 Outro assunto que precisamos trazer, a fim de complementar o que já foi dito a respeito de abster-se dos males, é a questão do livre arbítrio. Todo ser humano é criado com duas faculdades que o distinguem dos animais: a racionalidade e a liberdade. A racionalidade é a faculdade de entender a verdade, e a liberdade é resultante de a pessoa estar, quanto ao seu espírito, no equilíbrio entre o céu e o inferno. Daí ele a livre para ponderar e escolher o que ela quer se tornar na vida eterna. E essas faculdades dadas pelo Senhor não são tiradas de homem, espírito ou anjo algum.

 Portanto, especialmente nas matérias da vida espiritual, a pessoa deve ser livre para buscar e aprender as verdades, crer nelas e com elas formar sua consciência, sua fé, pelo que o livre arbítrio é condição essencial. No que diz respeito, então, a se abster dos males e fazer o bem, nenhuma pessoa deve ser forçada a isso, por quem quer que seja. As igrejas e os sacerdotes existem para ensinar e para conduzir, e não devem impor coisa alguma do que a pessoa deve crer ou deixar de crer, fazer ou deixar de fazer. Os ensinamentos sãos da igreja devem, por conseguinte, apelar à racionalidade do indivíduo e não à sua emoção, porque a racionalidade pertence ao entendimento, mas a emoção pertence à vontade. Enquanto o entendimento está fora, a vontade é o foro íntimo da pessoa, onde só Deus pode atuar, sem constranger a pessoa a seja o que for.

“É uma lei da Divina Providência que homem não seja constrangido por meios externos a pensar e a querer, assim, a crer nas coisas que são da religião e a amá-las, mas que o homem a si mesmo se persuada e, às vezes, se constranja a isso” (DP 129). Se não fosse o livre e a razão do homem, talvez Deus faria toda sorte de milagres e sinais, mandaria anjos e demônios e constrangeria todos a crer n’Ele e a serem levados para o céu. Mas, então, o homem não seria humano, mas um robô ou um toco, ou apenas uma casca, conservando em si um esforço latente de se rebelar contra aquilo a que foi constrangido.

Por isso a pessoa não pode ser constrangida a crer. Mas, por outro lado, constranger-se a si mesma não é contra a liberdade nem contra a racionalidade. Daí é que temos a outra lei da Divina Providência: “que o homem remova como por si mesmo os males como pecados no homem externo, e assim, e não de outro modo, o Senhor pode remover os males no homem interno e então, ao mesmo tempo, no externo.” (100, título)

Vemos, então, o que nos diz a obra Divina Providência na continuação sobre este ponto: (145)(v.) Não é contra a racionalidade e a liberdade constranger-se a si mesmo. ...No homem há um interno e um externo do pensamento, e ... esses são ... tão distintos que podem agir separadamente e podem agir conjuntamente. Agem separadamente quando o homem, pelo externo de seu pensamento, fala e faz diferentemente do que pensa e quer interiormente; e agem conjuntamente quando ele fala e faz o que interiormente pensa e quer. Isso é comum nos sinceros, mas não nos insinceros.

“[2] Ora, como o interno e o externo da mente são assim distintos, o interno pode até combater o externo e, pelo combate, impeli-lo ao consentimento. O combate existe quando o homem considera os males como pecados e, por isso, quer desistir deles, pois, quando desiste, abre-se uma porta que, sendo aberta, as concupiscências do mal que ocupavam o interno do pensamento são expulsas pelo Senhor e, em lugar delas, são implantadas as afeições do bem. Isso no interno do pensamento. Mas como os prazeres das concupiscências do mal, que ocupam o externo do pensamento, não podem ser expulsos ao mesmo tempo, existe daí um combate entre o interno e o externo do pensamento. O interno quer expulsar esses prazeres, porque são prazeres do mal e não concordam com as afeições do bem nas quais agora o interno se acha, e, em lugar dos prazeres do mal, quer introduzir os prazeres do bem, que concordam. São os prazeres do bem que se chamam bens da caridade. Dessa oposição tem origem o combate que, se aumenta, chama-se tentação.

“[3] Ora, como o homem é homem pelo interno de seu pensamento, pois este é o espírito mesmo do homem, vê-se que o homem a si mesmo se constrange quando constrange o externo de seu pensamento ao consentimento ou a que receba os prazeres de suas afeições, que são os bens da caridade. Que isso não seja contra a racionalidade e a liberdade, mas segundo elas, é evidente, pois a racionalidade faz esse combate e a liberdade o executa. Também, a liberdade mesma com a racionalidade reside no homem interno e, dele, no externo.

“[4] Quando, assim, o interno vence, o que acontece quando o interno reduz o externo ao consentimento e à submissão, então o Senhor concede ao homem a liberdade mesma e a racionalidade mesma, pois então o homem é tirado pelo Senhor do livre infernal, que em si é a servidão, e levado ao livre celeste, que em si é o livre mesmo, e concede-lhe a consorciação com os anjos.

“146.Seja, por exemplo, a seguinte ilustração: um homem que tinha sentido prazer nas defraudações e nos furtos clandestinos mas vê e reconhece interiormente que são pecados e, por esse motivo, quer desistir deles. Quando desiste, então tem origem um combate entre o homem interno e o externo. O homem interno está na afeição da sinceridade, mas o externo está ainda no prazer das defraudações. Esse prazer, porquanto é inteiramente oposto ao prazer da sinceridade, não se retira a menos que seja constrangido, nem pode ser constrangido a não ser por meio de combates. Então, quando o homem [interno] vence, o externo entra no prazer do amor do sincero, que é a caridade. Em seguida, gradativamente o prazer das defraudações se torna desprazer para ele. É semelhante em relação a todos os demais pecados, como os adultérios e devassidões, vinganças e ódios, blasfêmias e mentiras. Mas o combate mais difícil de todos é contra o amor de dominar pelo amor de si. Quem a este subjuga, facilmente subjuga os amores maus restantes, porque ele é a cabeça destes.”

 

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Atualização: Dezembro, 2022 - doutrinascelestes@gmail.com -