76. "As palavras
que Eu vos pronuncio são espírito e são vida"
76.1- Esta parte do curso é dedicada àqueles que
foram criados na fé cristã e que, sentindo afeto por sua religião, têm
trabalhado pelo progresso dela. A esses perguntamos: "Não sentis que
há, ainda, muitas questões que ficaram sem resolver? O afeto por vossa
religião será motivo bastante para que não continueis buscando mais
luz?"
76.2- O consolo que vossos pais encontraram na
crença que abraçaram e o terno cuidado com que vos transmitiram esse afeto,
para que ameis a religião em que nascestes, não é motivo, absolutamente,
para desfalecerdes na investigação de toda a Verdade que provém de Deus. Se
os apóstolos do Senhor, em fiel obediência às instruções dos escribas e
sacerdotes, tivessem deixado de procurar a Verdade, a Igreja Cristã jamais se
teria fundado. Se os pagãos tivessem seguido fielmente os ensinamentos que
receberam na meninice, a Igreja Cristã não se teria estendido sobre a terra.
76.3- O fato mais importante, entretanto, é este: os
próprios Evangelhos indicam que haveria de chegar o tempo em que uma nova luz
seria dada. O Senhor mesmo declarou:
"Ainda tenho muito que vos dizer, mas vós
não o podeis suportar agora. Porém, quando vier aquele Espírito de
Verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si mesmo,
mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que tiver de vir"
(João 16:1 2-13).
"Chega, porém, a hora em que vos não
falarei mais por parábolas, mas abertamente vos falarei acerca do Pai"
(João 16:25).
76.4- Não julgais haver muitas coisas difíceis de
entender nos Evangelhos? Coisas que ninguém vos explicou ainda? Conheceis,
por exemplo, o que existe de verdadeiro - o que é de importância fundamental
para o cristão - sobre a natureza da Trindade Divina? Muitas pessoas
acreditam que tais coisas não são ensinadas, porque não as podemos
compreender. Mas o Senhor nos ensina que, se não compreendermos as palavras
que ouvimos, elas de nada valerão:
"Ouvindo alguém a palavra do reino e não
a entendendo, vem o maligno e arrebata o que foi semeado no seu
coração" (Mateus 13:19).
Com quantas pessoas isto sucede? Conclui-se das
palavras do profeta Jeremias que não é da vontade de Deus que haja carência
de compreensão:
"Eu vos darei pastores segundo
meu coração, que vos apascentem com ciência e com inteligência"
(3:15).
Deus é "Deus de luz" e nos dá
compreensão. Aqueles que não nos encorajam a buscar conhecimentos e
inteligência não nos ensinam a Palavra de Deus.
76.5- Quando criou o homem, Deus lhe deu dois grandes
dotes: a capacidade de amar e a capacidade de entender. Se essas duas
faculdades não se voltam para Deus, elas se atrofiam e o homem deixa de ser a
imagem e a semelhança de Deus. O entendimento sem o amor é frio, formal e
sem vida; o amor sem o entendimento é sentimental, cheio de emoção e
necessita de verdade e de luz. Esses dois grandes dotes de Deus devem ser
unidos em nós, para podermos adorá-Lo em espírito e em verdade.
76.6- Apesar de muitas passagens obscuras e
incompreensíveis dos Evangelhos (e da Bíblia em geral), os que têm olhos
para ver poderão discernir a mão Divina nesses livros santos. Alguém pode
dizer: "Reconheço que os Evangelhos são celestialmente inspirados, mas
isso não significa que todas as palavras que neles figuram sejam de
Deus". A essa pessoa responderemos: "Amigo, se Deus é amor e deseja
revelar-Se à humanidade, certamente o fará de modo Divino".
Essa revelação - obra Divina da maior importância
- não poderia ser realizada de maneira imperfeita e fragmentária. O
missivista que escreve a pessoas que ama quer que a carta dê idéia exata de
seus sentimentos. Se alterasse a carta, não ficaria o missivista indignado?
Não lançaria ele mão de todos os recursos de que dispusesse para que a
carta verdadeira chegasse às mãos das pessoas queridas?
76.7 - Se imaginarmos que os Evangelhos são cartas
de Deus, poderemos admitir que Ele permitisse a adulteração dessas cartas? O
Senhor mesmo dizia que Ele ensinava por parábolas, e que muitas coisas sobre
as quais falava seriam explicadas futuramente: "Ainda tenho muito que vos
dizer, mas vós não o podeis suportar agora..." "Chega, porém, a
hora em que vos não falarei mais por parábolas, mas abertamente vos falarei
acerca do Pai" -(João 16: 25). Portanto, os Evangelhos foram escritos de
acordo com Sua Vontade, e a compreensão deles depende apenas de nosso grau de
percepção do Espírito de Verdade.
76.8 -Se compreendermos os Evangelhos como
procedentes de Deus, teremos de admitir a mesma origem para o Antigo
Testamento? Essa história do povo hebreu, com suas descrições de batalhas,
de crueldades e de ignorâncias será mesmo a Palavra de Deus? Esses escritos
curiosos, cuja autenticidade tem sido negada, e que, de vez em quando, se
referem a JEHOVAH como um Deus cruel e parcial, podem ser aceitos como
revelações Divinas?
76.9 -A resposta só pode ser afirmativa, leitor
amigo. Não se pode aceitar o Novo Testamento e negar o Antigo. Estes dois
Testamentos têm tanta relação entre si, que não podem ser separados. Se o
Antigo Testamento for negado, o Novo não terá base onde repousar. Não há
ensinamento mais veemente do Senhor Jesus Cristo do que aquele em que declara
que a Lei e os Profetas são a Palavra de Deus:
"Não cuideis que vim destruir a Lei e os
Profetas; não vim abrogar, mas cumprir. Porque em verdade vos digo que, até
que o céu e a terra passem, nem um iota ou um til se omitirá da lei, sem que
tudo seja cumprido" -(Mat. 5:17-18).
76.10 - Muitas coisas fez Jesus para dar cumprimento
às profecias, como Ele mesmo diz ao se dirigir aos apóstolos depois da
ressurreição:
"Ó néscios, e tardos de coração para
crer tudo o que os profetas disseram! Porventura não convinha que o Cristo
padecesse estas coisas e entrasse na Sua glória? E começando por Moisés,
e por todos os profetas, explicava-lhes o que d'Ele se achava em todas as
Escrituras" -(Lucas 24:25-27).
76.11 - Quando mais considerarmos o assunto, mais se
tornará evidente que a Lei e os Profetas foram dados a fim de revelar as
características e o comportamento do Messias que havia de vir. Todo o Antigo
Testamento é uma imensa parábola, como diz o salmista:
"Abrirei a minha boca numa parábola;
proporei enigmas da antigüidade" -(Salmo 78:2).
Antigo Testamento é, por assim dizer, o primeiro ato
de um drama Divino, representado pelo povo israelita, no qual se prepara o
advento do Messias. O Novo Testamento é o segundo ato desse drama, nele
figurando Jesus Cristo como personagem principal.
76.11 - Se, ao invés de elevarmos nossas mentes e
procurarmos compreender as coisas veladas, nos obstinarmos na interpretação
literal desse drama Divino, certamente seremos assediados pela dúvida e
mergulharemos nas trevas sem esperança. Nossa fé se debilitará e não
poderemos alcançar o "espírito" a que se referia Paulo na Segunda
Epístola aos Coríntios:
"O qual nos faz também
capazes de ser ministros dum novo testamento, não da letra, mas do
espírito; porque a letra mata e o espírito vivifica" (II Cor.3:6).
(Extraído das obras "O Livro Selado com Sete
Selos, Th.Pitcairn; e A Natureza do Espírito e do Homem", Rev. Ch.Giles)
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