80. Exemplos de
exposição do sentido interno ou espiritual por meio da ciência das
correspondências
80.1- Primeiro exemplo: A CIDADE
SANTA
80.1.1- A primeira passagem cujo
sentido interno vamos considerar é o primeiro versículo do capítulo 21 do
livro do Apocalipse, onde lemos:
"E levou-me em espírito a
um grande e alto monte, e mostrou-me a grande cidade, a santa Jerusalém,
que de Deus descia do céu".
80.1.2- Que significa esta cidade
santa, que também é chamada a Esposa do Cordeiro? Certamente não é uma
cidade material. Consideremos o que foi Jerusalém e logo se tornará claro o
que representa a referida cidade. Jerusalém foi a capital da terra de Canaã,
porém teve maior importância por ser o único lugar onde era permitido ao
povo israelita realizar os atos do culto. Em Jerusalém, os escribas e
fariseus copiavam as Escrituras e as estudavam, formulando suas doutrinas.
Logo, é perfeitamente compreensível que Jerusalém represente o culto e as
doutrinas do povo israelita. Jerusalém era o lugar onde se formulava a
doutrina de Deus e chegou a ser símbolo, por isso, da doutrina da Igreja. Dessa
forma, a santa cidade da Nova Jerusalém, a que se refere o versículo que
examinamos, é a representação das doutrinas celestiais que o Senhor
predisse, em Sua vida mortal, que seriam reveladas posteriormente aos homens.
80.2.3- Se aceitarmos essa idéia,
logo compreenderemos a descrição da cidade: os "muros" significam
a defesa da doutrina, para conservar puras as suas verdades; as
"portas" significam os ensinamentos que, em primeiro lugar, atraem
aqueles que buscam as verdades e os habilitam a entrar na glória de seus
segredos celestiais; e as "ruas" significam os caminhos da vida
daqueles que ingressam ali.
80.2.4- Na Palavra, uma cidade
representa, portanto, o conjunto de doutrinas para a vida, seja essa doutrina
falsa ou verdadeira. É o que se vê também no Apocalipse, a respeito de
outras cidades mencionadas:
"E jazerão os seus corpos
mortos na praça da grande cidade que espiritualmente se chama Sodoma e
Egito, onde o seu Senhor também foi crucificado" (11:8).
Ora, João sabia muito bem que o
Senhor não tinha sido crucificado em Sodoma nem no Egito. Não foi por
deslize que escreveu isso no Apocalipse, e sim por uma razão Divina, pois a
cidade que "espiritualmente se chama Sodoma e Egito" é a
representação de um princípio ou de uma doutrina específica de vida.
80.2.5- Já vimos que, em toda a
Palavra, a montanha significa uma exaltação do sentimento, isto é, um amor
(bom ou mau) da vontade. Assim, o fato de João ter sido levado em espírito a
"uma grande e elevada montanha" significa que ele foi transportado
ao terceiro céu onde se acham aqueles que estão no amor proveniente do
Senhor e, por Ele, na doutrina da verdade genuína. A doutrina foi vista em
forma de cidade porque a "cidade" significa a doutrina, e a Igreja
é Igreja pela doutrina e pela vida segundo a doutrina. Ela também foi vista
como cidade para que fosse descrita por sua muralha, suas portas, seus
fundamentos e por diversas medidas."
80.3- Segundo
exemplo: A GRANDE BABILÔNIA
80.3.1- Voltemos, agora, nossa
atenção para uma das cidades mencionadas no Antigo Testamento - a grande
Babilônia - e examinemos a seguinte passagem da Palavra:
"Ah! filha de Babilônia,
que vai ser assolada; feliz aquele que pegar em teus filhos e der com eles
nas pedras" (Salmo 137:8,9).
80.3.2- Que concluímos dessa
passagem? São tais palavras de um Deus de infinito amor? Contêm uma mensagem
do céu? Sim, amigo, contêm uma mensagem das mais necessárias.
80.3.3- É regra universal que os
homens julgam ser tratados de acordo com os seus próprios sentimentos. Por
isso, quando Deus se dirige a um povo cruel, Suas palavras são recebidas como
se Ele as tivesse proferido com crueldade; e quando Se dirige a um povo
orgulhoso, Suas palavras são percebidas como palavras de orgulho. Os judeus
eram um povo cruel e amavam a crueldade. Assim, quando JEHOVAH lhes falava,
eles interpretavam Suas palavras com um espírito característico, embora, a
fim de que a Palavra contivesse também o Amor e a Sabedoria Divina, Deus
tivesse provido para que, no seu íntimo, nela se encontrasse a sabedoria dos
anjos.
80.3.4- Vejamos, nos versículos que
estamos considerando, se é possível descobrir o significado da cidade que se
chama, espiritualmente, Babilônia. Babilônia foi a cabeça do primeiro
império mundial - governou autocraticamente segundo a vontade de seus
potentados e não de acordo com um sistema de leis. Os desejos e caprichos dos
reis de Babilônia tomaram o lugar das leis e da justiça nas terras por eles
subjugadas. Babilônia passou, assim, a simbolizar o desejo pelo domínio
autocrático - o amor de dominar segundo o capricho do próprio desejo e não
segundo a Lei Divina. Esse amor de dominar pode-se manifestar sob várias
modalidades. Pode ser exercido pelos reis e príncipes contra seus súditos,
por um pai de família contra a esposa e os filhos, por uma mulher contra suas
amigas, por um patrão contra seus empregados e em muitas outras
circunstâncias. Quando, em qualquer desses casos, uma pessoa impuser sua
vontade às outras, sem respeitar o direito e a justiça, estaremos diante do
amor da dominação simbolizado pela antiga cidade de Babilônia.
80.3.4- Se esse amor de domínio, se
esse exercício da tirania se apodera do homem, prende-o de tal modo, que ele
dificilmente poderá escapar. Por isso, é de suma importância desarraigar do
coração das crianças tão nocivo sentimento. O versículo em questão diz:
"Ah! filha de Babilônia, que vai ser assolada; feliz aquele que pegar em
teus filhos e der com eles nas pedras". Ora, sabendo que a
"cabeça" significa os princípios que se tem adotado e que a
"pedra", na Palavra, significa a verdade, por aí se vê que uma
cabeça em que se aninhem as maquinações da tirania deve ser
"rebentada" contra as pedras, ou seja, as idéias provenientes do
amor de dominar devem ser esfaceladas por uma confrontação com as verdades.
É isto, então, que este versículo quer dizer espiritualmente, segundo a
significação de "Babilônia", "cabeça" e
"pedras". Agora podemos compreender a mensagem do sentido interno:
felizes são aqueles que desmontam, por meio de verdades genuínas, os
princípios do amor de dominar simbolizados pelos filhos de Babilônia.
80.4- Terceiro
exemplo: a velhice de Pedro
80.4.1- Voltemo-nos, agora, para o
Novo Testamento, em cujas páginas se encontram, muitas vezes veladas como
veios de metal sob a terra, preciosíssimos ensinamentos.
80.4.2- Vejamos o significado
simbólico da seguinte passagem do Evangelho de João:
"Na verdade, na verdade, te
digo que, quando eras mais moço, te cingias a ti mesmo, e andavas por onde
querias; mas, quando já fores velho, estenderás as tuas mãos, e outro te
cingirá, e te levará para onde não queiras. E disse isto significando com
que morte havia ele de glorificar a Deus. E, dito isto, disse-lhe: Segue-me.
E Pedro, voltando-se, viu que o seguia aquele discípulo a quem Jesus amava,
e que na ceia se recostara também sobre o Seu peito. Vendo Pedro a este,
disse a Jesus: Senhor, e deste, que será? Disse-lhe Jesus: Se eu quero que
ele fique até que eu venha, que te importa a ti?" (João 21:18-22).
80.4.3- Os doze apóstolos do Senhor,
assim como os doze filhos de Israel, representavam os princípios gerais que
formam a doutrina da Igreja. Pedro e João, sendo os principais discípulos,
simbolizavam, respectivamente, os dois princípios capitais da Igreja: a fé e
a caridade. Do próprio sentido literal do Novo Testamento podemos concluir
que Pedro representa a fé, pois, quando o Senhor pediu a Seus discípulos uma
declaração de fé, foi Pedro quem a deu:
"Tu és o Cristo, o Filho
de Deus vivo" (Mateus 16:16).
Pedro, em grego, quer dizer
"pedra", nome que lhe foi dado pelo Senhor por uma razão muito
especial. Disse-lhe o Senhor:
"Pois também eu te digo
que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a Minha igreja..."
(Mateus 16:18).
A fé é como uma pedra sobre a qual
a Igreja está fundada, assim como uma rocha é o alicerce sobre o qual o
templo é construído.
80.4.4- João representa o amor ou as
boas obras, o que também deduzimos de passagens do Novo Testamento. Tudo
aquilo que João escreveu nos dá testemunho do amor que lhe tinha o Senhor e
do amor que um cristão fiel deve sentir pelo seu próximo. É porque
representa tal amor que ele é chamado, nos Evangelhos, o discípulo amado.
80.4.5- Aqueles que procuram
compreender a Palavra de Deus hão de sentir necessidade de uma
interpretação clara da parte do Capítulo 21 de João, acima transcrita, de
modo a não deixar dúvidas sobre a declaração ali contida. Certamente, a
morte de Pedro foi uma tragédia, porém a predição de sua morte, feita pelo
Senhor, foi uma tragédia maior que a da desaparição de um homem. E isso
porque Pedro não rclaração ali contida. Certamente, a
morte de Pedro foi uma tragédia, porém a predição de sua morte, feita pelo
Senhor, foi uma tragédia maior que a da desaparição de um homem. E isso
porque Pedro não representava apenas um homem, mas a fé da Igreja Cristã. A
pergunta que o Senhor dirigiu, por três vezes, a Pedro: "Amas-me?"
e a recomendação que lhe fez, dão a entender que o amor daqueles que Pedro
representa poderia esfriar e que eles poderiam deixar de apascentar as ovelhas
do rebanho do Senhor.
80.4.6- Quem quer que raciocine sobre
o assunto pode concluir imediatamente que a recomendação feita a Pedro
"Apascenta as Minhas ovelhas" era dirigida a todos os que tivessem
de propagar a fé da Igreja Cristã. E a passagem dá-nos a entender que havia
perigo de que esta fé corresse o risco de não ser ensinada em espírito e em
verdade! "Quando já fores velho, outro... te levará para onde não
queiras" significa que, quando perdesse o espírito de juventude, a
Igreja Cristã seria desviada pelos interesses mundanos e pelas ambições.
Pedro (representando a Igreja) seria cingido por outro e levado para onde não
queria ir. A Igreja seria desvirtuada, e o "outro" que a desviou
representa os homens que formularam credos não contidos na doutrina pregada
por Jesus Cristo. Desviada do caminho da Verdade, a Igreja passou a exigir que
os homens aceitassem novos credos, embora ela já não fosse guiada pela luz
da Verdade.
80.4.7- "Se eu quero que ele
(João) fique até que eu venha, que te importa a ti?" quer dizer que
aqueles representados por João (amor), ou seja, aqueles que estivessem na
caridade, seriam, entretanto, resguardados pelo Senhor até que Ele voltasse
novamente para estabelecer, agora plenamente, a Sua Igreja. João representa
todos os que têm amor genuíno ao Senhor e que obedecem à Sua Palavra, ainda
que em assuntos de fé - como a natureza da Divina Trindade, a maneira da
salvação e a natureza da ressurreição - possam estar em ignorância. A
velhice de Pedro corresponde, pois, ao declínio e à falta de fé na Igreja
Cristã.
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