1. Pela Divina Misericórdia do Senhor, os interiores que pertencem ao meu espírito me foram abertos; e por esse meio foi-me possível falar não somente com os espíritos e os anjos que estão próximo de nossa Terra, mas também com os que estão próximo de outras terras. Tendo tido, por consequência, desejo de saber se existiam outras terras, quais seriam tais terras e quais os seus habitantes, foi-me possibilitado falar e conversar com os espíritos e anjos que provêm de outras terras, com uns por um dia, com outros por uma semana e com outros por meses, e ser instruído por seu intermédio sobre as terras das quais provinham e perto das quais estavam, e a respeito da vida, dos costumes, e do culto dos habitantes, e das diversas coisas dignas de serem relatadas. E, visto que foi possível saber essas coisas dessa maneira, é permitido descrevê-las, de acordo com o que foi ouvido e visto. É preciso que se saiba que todos os espíritos e todos os anjos provêm do gênero humano ([1]); que eles estão próximos de sua terra([2]); e sabem o que há lá; e que a pessoa cujos interiores foram abertos de tal modo que possa falar e conversar com eles, pode ser instruída por seu intermédio; pois o ser humano em sua essência é um espírito([3]); e está junto a espíritos quanto a seus interiores([4]); aquele, pois, em quem os interiores são abertos pelo Senhor, pode falar com eles, como uma pessoa com outra([5]). Isso me foi concedido a cada dia, agora por doze anos.
2. Que existam muitas terras, e sobre elas seres humanos, e daí espíritos e anjos, é bem sabido na outra vida, pois, lá, a quem quiser por amor da verdade e do uso que daí procede, lhe é concedido falar com espíritos de outras terras e ser por isso confirmado sobre a pluralidade dos mundos, e ser informado que o gênero humano não provém somente de uma só terra, mas de inúmeras terras e, além disso, de que natureza e vida são os habitantes, e qual é o seu culto Divino.
3. Falei algumas vezes com espíritos de nossa Terra sobre esse assunto e foi dito que a pessoa que goza de um bom entendimento pode saber, pelas muitas coisas que conhece, que há muitas terras e que lá existem seres humanos. Pois, pela razão, ela pode concluir que massas tão grandes como são os planetas, dos quais alguns ultrapassam esta Terra em grandeza, não são massas vazias e criadas somente para serem conduzidas e percorrerem o espaço ao redor do sol e darem um pouco de sua luz a uma só terra; mas é preciso que seu uso seja mais importante que isso. Quem crê, como cada um deve crer, que o Divino não criou o universo com outro propósito senão a fim de que exista o gênero humano, e o céu daí proveniente (pois o gênero humano é a sementeira do céu), não pode agir de outro modo senão crer que existem seres humanos onde quer que haja alguma terra.
[2] Que os planetas, que são visíveis aos nossos olhos porque se encontram dentro dos limites deste sistema solar, são terras, pode-se saber claramente por isto, que são corpos de matéria terrestre, visto que refletem a luz do sol e porque, observados com telescópios, aparecem, não cintilantes de chama como as estrelas, mas sim como terras matizadas de partes obscuras. E, também, porque são, como nossa Terra, conduzidos ao redor do sol e progridem pela via do zodíaco e, por conseguinte, marcam anos e estações do ano, que são a primavera, o verão, o outono e o inverno. Do mesmo modo, como nossa Terra, giram ao redor de seu eixo e, por conseguinte, marcam dias e os períodos do dia, a saber, a manhã, o meio-dia, a tarde e a noite. E ainda mais, alguns dentre eles têm luas, que são chamadas satélites, e movem-se em tempos determinados ao redor de seu globo, como a lua ao redor do nosso. E o planeta Saturno, porque está muito distante do sol, tem um anel luminoso que dá muita luz àquela terra, ainda que seja refletida. Quem é que, conhecendo estas coisas e pensando pela razão, pode dizer que eles são corpos vazios?
4. Além disso, falei com espíritos que o ser humano pode ser capaz de crer que há no universo mais que uma só terra; por isso, o céu estelar é tão imenso e nele existem inúmeras estrelas, e cada uma delas em seu lugar ou em seu mundo é um sol, como nosso sol, em vários tamanhos. Quem quer que pondere corretamente conclui que esse todo tão imenso não pode ser senão um meio para um fim, que é o último da criação, cujo fim é um Reino Celeste onde o Divino possa habitar com anjos e homens. Com efeito, o universo visível, ou o céu iluminado por inúmeras estrelas, que são tantos sóis, é somente um meio para que existam terras e nelas seres humanos, dos quais o Reino Celeste é formado. Assim a pessoa racional não pode agir de outro modo senão pensar que esse meio imenso para tão grande fim não foi feito para o gênero humano de uma só terra e o Céu daí proveniente. Que seria isso para o Divino, Que é Infinito, a Quem milhares e mesmo miríades de terras, e todas cheias de habitantes, seriam muito pouco e dificilmente alguma coisa?
5. Além disso, o céu angélico é tão imenso que corresponde a cada coisa no ser humano, e existem miríades de coisas que correspondem a cada uma de suas afeições. E pude saber que o céu não pode de jeito nenhum existir, quanto a todas as suas correspondências, senão pelos habitantes de um número de terras muito grande([6]).
6. Existem espíritos cuja única aplicação é adquirir conhecimentos para si próprios, porque eles só se deleitam com isso. Em consequência, é permitido a esses espíritos irem por toda parte e também passarem deste sistema solar para outros sistemas, e adquirirem conhecimentos para si. Esses disseram que existem terras com seres humanos nelas, não somente neste sistema solar, mas também fora deste sistema, no céu estelar, em número imenso. Esses espíritos são do planeta Mercúrio.
7. Quanto ao que concerne em geral ao culto Divino dos habitantes de outras terras, todos os que lá não são idólatras reconhecem o Senhor como único Deus. Com efeito, eles adoram o Divino, não como um Divino invisível, mas como visível, e isso também porque, quando o Divino lhes aparece, Ele aparece na forma humana, como antigamente, do mesmo modo por que aparecia a Abrahão e a outros nesta Terra([7]). E os que adoram o Divino sob a forma humana são todos aceitos pelo Senhor([8]). Eles dizem também que ninguém pode prestar culto a Deus diretamente, e menos ainda estar conjunto a Ele, sem que O compreenda por meio de alguma ideia, e que Ele não pode ser compreendido senão na forma humana; e que, se não for assim a visão interior de Deus que pertence ao pensamento é dissipada como a visão do olho, quando se fita o universo sem limite; que, então, o pensamento não pode deixar de cair sobre a natureza, e esta ser adorada no lugar de Deus.
8. Quando lhes foi informado que o Senhor assumiu o Humano em nossa Terra, refletiram um pouco e, depois, disseram que isso foi feito para a salvação do gênero humano.
A terra ou planeta Mercúrio e seus espíritos e habitantes
9. Que o céu todo represente um só ser humano que é, por isso, chamado o Máximo Homem, e que todas e cada uma das coisas no ser humano, tanto as exteriores quanto as interiores, correspondam a esse Máximo Homem, ou ao céu, é um arcano ainda não conhecido no mundo, mas, que isso seja assim, é o que foi mostrado em várias partes (veja rodapé 6). Mas, para constituir esse Máximo Homem, os que vêm de nossa Terra para o céu não são suficientes, são relativamente poucos; é preciso que eles venham de muitas outras terras e é provido pelo Senhor para que, assim que falte em algum lugar uma qualidade ou uma quantidade para a correspondência, sejam logo tiradas de uma outra terra pessoas que preencham esse lugar, a fim de que a relação exista e assim sustente o céu.
10. O que os espíritos do Planeta Mercúrio representam no Máximo Homem também me foi revelado do céu: é a memória, mas a memória de coisas abstraídas do que é terrestre e puramente material. Ora, como me foi possível falar com eles, e isso por muitas semanas, e vir a saber de que natureza eles são, e examinar como acontece com os que estão naquela terra, vou relatar as [minhas] próprias experiências.
11. Uns espíritos vieram a mim e foi-me comunicado do céu que eram de uma terra próxima ao Sol, que é na nossa Terra chamada pelo nome de planeta Mercúrio; e assim que chegaram, procuraram o que eu sabia pela minha memória (é o que os espíritos podem fazer muito habilmente, pois, quando vêm à pessoa, veem em sua memória cada uma das coisas que lá estão)([9]); enquanto eles procuravam várias coisas, entre elas, as cidades e os lugares onde eu estivera, notei que não queriam tomar conhecimento dos templos, palácios, casas e ruas [em si], mas somente das coisas que eu sabia terem acontecido nesses lugares e depois, as concernentes ao governo, à aptidão e aos costumes das pessoas de lá, e outras coisas semelhantes, pois tais coisas são associadas com os lugares na memória do ser humano; é por isso que, quando os lugares são lembrados, elas também sobrevêm. Admirei-me de que esses espíritos fossem assim e, por isso, perguntei-lhes por que desprezavam as magnificências dos lugares e procuravam somente as coisas e os fatos que ali se passaram. Responderam que não tinham prazer nenhum em considerar coisas materiais, corporais e terrestres, mas que amavam somente contemplar as coisas reais. Daí foi confirmado que os espíritos dessa terra representam no Máximo Homem a memória das coisas abstraídas do que é material e terrestre.
12. Foi-me informado que tal é a vida dos habitantes nessa terra, isto é, que eles não dão atenção alguma às coisas terrestres e corporais, mas que se ocupam dos estatutos, leis e governos das nações que lá existem, e também das coisas que têm relação ao céu, que são inumeráveis. Também tomei conhecimento de que muitas das pessoas dessa terra falam com espíritos, e que daí lhes vêm os conhecimentos das coisas espirituais e dos estados da vida após a morte e também o desprezo pelos objetos corporais e terrestres. Pois, os que sabem por certo e creem que existe uma vida após a morte, ocupam-se das coisas celestes, porque elas são eternas e trazem a felicidade, e não das coisas mundanas, senão tanto quanto as necessidades da vida requerem. Como tais são os habitantes, por isso mesmo tais são também os espíritos que provêm dessa terra([10]).
13. Pude ver com que avidez procuram e extraem os conhecimentos das coisas, tais como as da memória elevada acima das coisas dos sentidos do corpo, de modo que, quando examinavam o que eu sabia sobre coisas celestes, percorriam-nas todas e diziam sem se deter: "Esta é tal, aquela é tal". Com efeito, quando os espíritos vêm à pessoa, entram em toda sua memória e ali despertam as coisas que lhes convêm; e mesmo, o que muitas vezes notei, leem como num livro as coisas que ali se encontram([11]). Esses espíritos faziam isso com mais rapidez e destreza [do que outros], porque não se detinham em redor das coisas que eram pesadas e lentas, que estreitam e, consequentemente, retardam a visão interior, como sucede com todas as coisas terrestres e corporais quando se tem elas por fim, isto é, quando são amadas unicamente; mas eles consideravam as coisas mesmas, pois aquelas às quais o que é terrestre não adere, levam a mente (animus) para cima, assim a um campo vasto. Enquanto os objetos puramente materiais a levam para baixo, limitando-a e fechando-a. Sua avidez por adquirir conhecimentos e por enriquecer a sua memória ficou ainda mais evidente pelo seguinte: Um dia em que eu escrevia algo sobre os eventos futuros, como eles estavam afastados de mim, de maneira que não podiam examinar essas coisas pela minha memória, ficaram muito indignados porque eu não queria lê-las em sua presença e queriam, contra o seu costume comum, encolerizar-se contra mim, dizendo que eu era muito mau, e outras coisas tais, e, para mostrar a sua ira, introduziram na parte direita da minha cabeça, até a orelha, uma espécie de contração com uma dor; mas isso em nada me fez mal. Todavia, como tinham agido mal, afastaram-se ainda mais, mas, logo depois se detiveram, querendo saber o que eu escrevera: tal é o seu ardente desejo por conhecimentos.
14. Os espíritos de Mercúrio possuem, mais que todos os outros espíritos, os conhecimentos das coisas, tanto das que estão neste sistema solar, quanto das que estão fora dele, no céu estelar; e os conhecimentos uma vez adquiridos, retêm-nos e também deles se lembram todas as vezes que lhes ocorrem coisas semelhantes. Por aí também se pode ver claramente que os espíritos têm uma memória, e muito mais perfeita que a memória das pessoas; e que os espíritos retêm as coisas que ouvem, veem e percebem e, sobretudo, as coisas em que se deleitam, como é o caso desses espíritos e os conhecimentos das coisas, pois o que é agradável e amado influi quase como de sua própria vontade e permanece; o resto não entra, mas somente toca a superfície e passa.
15. Quando os espíritos de Mercúrio vêm para outras sociedades, examinam o que sabem delas e, após a observação, retiram-se; há também entre os espíritos, principalmente entre os anjos, uma comunicação tal que, quando estão numa sociedade, se são aceitos e amados, todas as coisas que sabem são informadas([12]).
16. Mais que todos os outros, os espíritos de Mercúrio são orgulhosos por causa de seus conhecimentos; por isso, lhes foi dito que, embora eles soubessem inúmeras coisas, ainda assim havia uma infinidade de outras que não sabiam; e que, se os seus conhecimentos fossem aumentados para sempre, não poderiam sequer alcançar uma noção de todas as coisas gerais; e também que tinham orgulho e uma altivez de espírito (elatio animi) e que isso não ficava bem; mas responderam que não era orgulho, mas somente uma vaidade pela capacidade de sua memória; assim conseguem desculpar os seus defeitos.
17. Eles têm aversão à linguagem de palavras porque esta é material, por isso, quando não havia espíritos intermediários, não pude falar com eles senão por uma espécie de pensamento ativo. Sua memória, sendo uma memória de coisas em si e não de imagens puramente materiais, fornece de mais perto seus objetos ao pensamento; pois o pensamento, que está acima da imaginação, requer como objetos as coisas em si, abstraídas do que é material. Embora isso seja assim, todavia os espíritos de Mercúrio brilham pouco com relação à faculdade do juízo; eles não se agradam das coisas que pertencem ao juízo e às conclusões tiradas dos conhecimentos, pois os conhecimentos nus são os seus deleites.
18. Foi-lhes perguntado se não queriam fazer uso algum de seus conhecimentos, pois deleitar-se em conhecimentos não é o suficiente, porque os conhecimentos têm os usos em vista, e os usos devem ser os fins; dos conhecimentos somente não resultam usos a eles próprios, mas a outros aos quais querem comunicar seus conhecimentos; e não convém de modo algum à pessoa, que deseja ser sábia, permanecer somente nos conhecimentos, porque eles não são senão causas auxiliares, devendo servir para se procurarem as coisas que devem ser da vida; mas eles responderam que se deleitavam nos conhecimentos somente, e que assim os conhecimentos lhes são úteis.
19. Alguns desses espíritos nem mesmo querem aparecer como seres humanos, assim como os espíritos de outras terras aparecem, mas sim como globos cristalinos; que queiram aparecer assim, ainda que não o façam, é porque os conhecimentos das coisas imateriais são representados na outra vida por cristais.
20. Os espíritos de Mercúrio diferem inteiramente dos espíritos de nossa Terra, pois os espíritos de nossa Terra não se ocupam tanto destas coisas, mas ocupam-se das mundanas, corporais e terrestres, que são materiais; por essa razão, os espíritos de Mercúrio não podem estar junto dos espíritos de nossa Terra; por consequência, onde quer que os encontrem, fogem, pois as esferas espirituais que emanam de um e do outro são quase contrárias. Os espíritos de Mercúrio dizem usualmente que não querem considerar o envoltório das coisas, mas as coisas despidas de seu envoltório, assim os interiores.
21. Apareceu uma chama bem branca, brilhando vivamente, e isso por quase uma hora; essa chama simbolizava a vinda de espíritos de Mercúrio, que eram mais rápidos do que os anteriores, no que diz respeito ao exame, pensamento e fala. Quando chegaram, percorreram logo as coisas que estavam na minha memória; mas por causa de sua presteza, eu não pude perceber o que observavam; em seguida eu os ouvia dizer: "Isso é tal!" Quanto às coisas que eu vira nos céus e no mundo dos espíritos, diziam que as sabiam antes. Eu percebia que havia por detrás, um pouco à esquerda, ao nível do occipício, uma multidão de espíritos consociados a eles.
22. De outra vez, vi uma multidão de tais espíritos, mas a certa distância de mim, na frente um pouco à direita, e de lá falavam comigo, mas por espíritos intermediários; pois sua linguagem, sendo tão rápida quanto o pensamento, não caía na linguagem humana senão por meio de outros espíritos agindo como intermediários; e, o que me surpreendeu, falavam todos juntos e sempre com presteza e rapidez. Sua linguagem, porque provinha de muitos falando juntos, era percebida como ondulatória; e, o que é memorável, deslizava voltada para o meu olho esquerdo, embora esses espíritos estivessem à direita. Isso porque o olho esquerdo corresponde aos conhecimentos das coisas abstraídas do que é material, assim às que pertencem à inteligência; mas o olho direito, às que pertencem à sabedoria([13]). Eles percebiam também, com a mesma presteza com que falavam, as coisas que ouviam, e avaliavam-nas, dizendo: "Isto é assim, isto não é assim!" Seu poder de julgamento era como que instantâneo.
23. Havia um espírito de uma outra terra que podia falar com eles com destreza, porque falava com destreza e rapidez, mas que procurava obter elegância na linguagem; num instante eles formaram o seu conceito a respeito do que ele pronunciava dizendo: "Isso é muito elegante, isso é muito artístico!" de modo que somente prestavam atenção se escutavam dele algo que não lhes fora ainda conhecido, rejeitando, assim, as coisas que causavam escuridão, que eram principalmente as pretensões de elegância de linguagem e erudição, pois elas escondem as coisas mesmas e, em seu lugar, apresentam palavras que são as formas materiais das coisas. Pois a pessoa que fala fixa o seu pensamento (animus) nas palavras, e quer que se preste mais atenção a elas do que ao seu significado; portanto o ouvido do outro é mais afetado que a sua mente (mens).
24. Os espíritos do Planeta Mercúrio não se demoram em um só lugar, ou no meio de grupos de espíritos de um só mundo, mas percorrem o universo; isso porque eles representam a memória das coisas, que deve ser continuamente enriquecida. É por isso que lhes é concedido percorrer toda parte e adquirir conhecimentos em qualquer lugar. Quando viajam assim, se eles encontram espíritos que amam as coisas materiais, isto é, as coisas corporais e terrestres, fogem deles e dirigem-se aos lugares onde não ouvem falar de tais coisas. Por aí se pode ver que a sua mente é elevada acima das coisas sensuais e estão, assim, numa luz interior. Isso também me foi possível perceber efetivamente, quando estavam perto de mim e falavam comigo; notei, então, que eu estava desprendido das coisas dos sentidos, a ponto de a luz de meus olhos começarem a enfraquecer-se e a tornar-se obscura.
25. Os espíritos dessa terra andam em grupos e turmas; e, quando se reúnem, formam como que um globo; assim são conjuntos pelo Senhor, a fim de que ajam em união, e os conhecimentos de cada um sejam comunicados a todos, e os conhecimentos de todos a cada um, como acontece no Céu. Que esses espíritos percorram o universo para coletarem os conhecimentos das coisas, também me foi mostrado certa vez quando eles apareciam muito longe de mim, e de lá falavam comigo e diziam que agora se tinham reunido, e que iam fora da esfera deste mundo para o céu estelar, onde sabiam que existiam espíritos que se ocupam, não de coisas terrestres e corporais, mas de coisas elevadas acima destas, com quem queriam estar. Fui informado que eles mesmos não sabiam para onde iam, mas que eram levados por orientação Divina aos lugares onde podiam ser instruídos a respeito das coisas que ainda não sabiam e que eram conformes aos conhecimentos que tinham. Aprendi também que não sabiam como encontravam os companheiros com quem se conjuntam, e que isso também é feito por orientação Divina.
26. Visto que percorrem assim o universo e daí podem mais que outros saber a respeito de mundos e terras fora deste sistema solar, também conversei com eles sobre este assunto. Disseram-me que existem muitas terras no universo e nelas, seres humanos; e se admiravam de que alguns, a quem chamavam de pessoas de pouco juízo, pensassem que o céu de Deus Todo-Poderoso fosse somente composto de espíritos e anjos que chegam de uma só terra, quando estes seriam tão poucos que, com relação à Onipotência de Deus, seriam dificilmente alguma coisa, mesmo que houvesse miríades de mundos e miríades de terras. E mais, disseram que sabem que no universo existem terras que, em número, ultrapassam algumas centenas de milhares e, entretanto, que é isso com relação ao Divino que é Infinito?
27. Quando os espíritos de Mercúrio estavam comigo enquanto eu escrevia e explicava a Palavra quanto a seu significado interior e percebiam o que escrevia, diziam que as coisas que eu escrevia eram muito grosseiras e quase todas as expressões apareciam como materiais; porém, pude responder que as pessoas de nossa Terra veem estas coisas que foram escritas justamente como sutis e elevadas, muitas das quais não compreendem; acrescentei que muitos nesta Terra não sabem que existe um homem interior que age no homem externo e faz que este viva, e se persuadem pelas falácias dos sentidos de que a vida é do corpo; e é por isso que aqueles que são maus e infiéis põem a vida após a morte em dúvida; e mais, aquilo do ser humano que viverá após a morte do corpo denominam alma e não espírito; e debatem sobre o que é a alma e onde fica o seu lugar [no corpo]; e acreditam que o corpo material, ainda que seja disperso completamente, deve ser conjunto de novo a ela, para que a pessoa viva como um ser humano, além de muitas coisas semelhantes. Quando os espíritos de Mercúrio ouviram isso, perguntaram se tais pessoas podiam se tornar anjos, ao que tive a oportunidade de responder que os que viveram no bem da fé e da caridade tornam-se anjos e que, então, não estão mais nas coisas externas e materiais, mas estão nas coisas interiores e espirituais; e quando chegam a esse estado, estão numa luz acima daquela em que estão os espíritos provindos de Mercúrio. A fim de que eles ficassem cientes de que isso se passa dessa forma, foi permitido que um anjo, que presentemente está no céu de nossa Terra e tinha sido tal quando vivia no mundo, falasse com eles; a esse respeito veja o que se segue abaixo no parágrafo 37.
28. Mais tarde, foi-me enviado pelos espíritos de Mercúrio uma longa folha de papel, disforme, formada de vários pedaços de papel colados juntos, que parecia ter sido impressa com caracteres tais como os desta Terra. Perguntei-lhes se tinham essas coisas consigo; responderam que não tinham, mas, que sabiam que essas folhas impressas existem na nossa Terra; não quiseram falar mais nada, porém percebi que pensavam que na nossa Terra os conhecimentos estavam nos papéis e, por consequência, não na pessoa; assim, zombando de que os papéis, por assim dizer, sabiam o que a pessoa não sabia; mas foram instruídos a respeito do modo como isso se dá. Algum tempo depois, voltaram e enviaram-me uma outra folha de papel escrita também com caracteres de imprensa como a anterior, mas não feita de colagens e grosseira, e sim bem feita e aprimorada; disseram-me que tinham sido informados mais tarde de que existem essas folhas de papel nesta terra e livros feitos delas.
29. Por essas coisas que foram ditas agora, está evidente que os espíritos retêm na memória as coisas que veem e ouvem na outra vida, e podem, por isso, ser instruídos do mesmo modo que quando eram pessoas, no mundo, nas coisas que dizem respeito à fé e, assim, podem ser aperfeiçoados. Quanto mais os espíritos e os anjos se tornam interiores, tanto mais as absorvem prontamente e plenamente, e retêm-nas perfeitamente; e como isso dura para sempre, é evidente que neles a sabedoria cresce continuamente. Com os espíritos de Mercúrio o conhecimento das coisas aumenta sucessivamente, mas não por isso, a sabedoria, porque amam os conhecimentos que são os meios e não os usos que são os fins.
30. Além disso, pode-se ver ainda mais pelas coisas seguintes qual é a natureza dos espíritos que são do planeta Mercúrio. É preciso que se saiba que todos os espíritos e anjos, tantos quantos existem, foram pessoas comuns, pois o gênero humano é a sementeira do céu; e os espíritos, quanto às afeições e às inclinações, são completamente tais como foram quando viveram como seres humanos no mundo, pois a vida de cada um o segue([14]). Visto que isso é assim, a natureza dos seres humanos de cada terra pode ser conhecida pela natureza dos espíritos que daí provêm.
31. Como os espíritos de Mercúrio, no Máximo Homem, representam a memória das coisas abstraídas do que é material, disso resulta que, quando alguém lhes fala de coisas terrestres, corporais e puramente mundanas, não querem absolutamente escutá-las; e, se são forçados a ouvir essas coisas, convertem-nas em outras e, na maioria das vezes, em coisas opostas, a fim de que as evitem.
32. A fim de que eu soubesse por certo que a sua natureza era tal, foi permitido serem representados diante deles campos cultivados, pradarias, jardins, florestas e rios (representar tais coisas é, pela imaginação, apresentar coisas diante de alguém, as quais na outra vida aparecem como coisas reais); mas eles as transformavam no mesmo instante; obscureciam as pradarias e os campos e, por meio de representações, enchiam-nos de serpentes; enegreciam os rios, para que a água não aparecesse límpida. Quando perguntei por que faziam isso, disseram que não queriam pensar a respeito de tais objetos, mas sim de objetos reais que são os conhecimentos das coisas abstraídas do que é terrestre e, principalmente, os conhecimentos de coisas como as que existem nos céus.
33. Em seguida, representei diante deles aves grandes e pequenas como as que existem na nossa Terra, pois na outra vida essas coisas podem ser representadas como se fossem reais. Quando viram essas aves representadas queriam, primeiro, transformá-las, mas, em seguida, deleitaram-se com elas e acalmaram-se. Isso porque as aves simbolizavam os conhecimentos das coisas e a percepção desse simbolismo também influía nesse momento([15]); assim desistiram de transformá-las e, por consequência, de desviar as ideias de sua memória. Depois disso, foi permitido representar diante deles um agradabilíssimo jardim cheio de lanternas e velas; então pararam e foram detidos, e isso porque as lanternas com velas simbolizam as verdades que brilham do bem([16]). Por aí se vê que eles podiam ser mantidos na contemplação de coisas materiais, contanto que, ao mesmo tempo, seu simbolismo no significado espiritual fosse insinuado, pois as coisas que são do significado espiritual não tinham sido abstraídas tanto assim das coisas materiais, visto que são representações delas.
34. Além disso, falei-lhes de ovelhas e cordeiros; mas não queriam escutar tais coisas, porque as percebiam como terrestres; isso porque não compreendiam o que é a inocência que os cordeiros simbolizam. Mas isso foi percebido quando eu disse que os cordeiros representados no céu simbolizam a inocência([17]); responderam que não sabiam o que era a inocência, mas que só a conheciam com respeito ao nome. Isso porque eles são afetados somente pelos conhecimentos, mas não pelos usos, que são os fins dos conhecimentos e, assim, não podem saber por uma percepção interior o que é a inocência.
35. Alguns dos espíritos do planeta Mercúrio vieram a mim, enviados por outros, para ouvir o que se passava comigo. Um dos espíritos de nossa Terra recomendou-lhes que dissessem aos seus que não falassem outra coisa que a verdade e não apresentassem, como costumam fazer, coisas contrárias aos que lhes fizessem perguntas; pois, se algum dos espíritos de nossa Terra agisse assim, seria punido. Mas então, o grupo que estava afastado e do qual esses espíritos tinham sido enviados, respondeu que, se alguns dos seus fossem punidos por isso, eles todos teriam que ser punidos, uma vez que eles não podiam agir de outro modo por causa de seu hábito contínuo. Disseram que quando falam com as pessoas de sua própria terra, também agem assim, não com intenção de enganar, mas para inspirar-lhes o desejo de saber; pois, quando apresentam coisas contrárias e ocultam as coisas de um certo modo, o desejo de saber é despertado e, assim, pela aplicação em examiná-las, a memória é aperfeiçoada. Também falei uma outra vez com eles sobre o mesmo assunto e, como sabia que falavam com as pessoas de sua terra, perguntei como instruíam os seus habitantes. Disseram-me que não os instruem do modo como a coisa realmente é, porém, insinuam alguma percepção da coisa, a fim de que por aí o desejo de examinar e de saber seja desenvolvido e cresça, pois, se respondessem a tudo, o desejo morreria. Acrescentaram que apresentam coisas opostas também, para que a verdade depois apareça melhor, pois toda verdade aparece pela relação com as coisas opostas.
36. Eles têm por costume não dizer o que sabem a ninguém; no entanto, querem aprender de todos o que eles sabem; mas comunicam tudo à sua sociedade, a ponto de que o que um sabe, todos sabem e, o que todos sabem, cada um lá também sabe.
37. Como os espíritos de Mercúrio têm conhecimentos em abundância, sentem uma espécie de orgulho; daí pensam que sabem tantas coisas que dificilmente se poderia saber mais. Entretanto, espíritos de nossa Terra lhes disseram que eles não sabem muitas coisas, mas poucas e, as que não sabem, em relação às que sabem, são como as águas de um grande oceano em relação às águas de uma pequena fonte; e, também, o primeiro passo para a sabedoria é saber, reconhecer e perceber que o que se sabe é tão pouco em relação às coisas que não se sabe que é, dificilmente, coisa alguma. Para que aprendessem que isso era assim, foi concedido a um certo espírito angélico falar com eles e explicar-lhes, em geral, o que sabiam e o que não sabiam; as coisas que não sabiam eram inumeráveis e nem mesmo poderiam saber sequer as generalidades das coisas pela eternidade. Ele falava, por meio de ideias angélicas, muito mais prontamente que eles; e como revelava o que sabiam e o que não sabiam, ficaram atônitos. Em seguida, vi um outro anjo falando com eles; ele apareceu a uma certa altura à direita; esse anjo era de nossa Terra e lhes relatava numerosíssimas coisas que não sabiam e, depois, falava-lhes por meio de mudanças de estado que diziam não compreender; então, dizia-lhes que cada mudança de estado e, também, cada pequena parte de uma mudança de estado continha coisas inumeráveis. Quando ouviram isso, como tinham sido orgulhosos por causa de seus conhecimentos, começaram a humilhar-se. A sua humildade foi representada pelo abaixamento de sua massa volumosa (pois este grupo aparecia, então, como uma massa volumosa em frente, voltada para a esquerda, a certa distância, à altura da região abaixo do meio do ventre); mas essa massa aparecia como se tivesse sido cavada no meio e elevada nos lados; observava-se também, ali, um movimento recíproco. Foi-lhes mesmo comunicado o que isso simbolizava, isto é, o que pensavam em sua humildade e aqueles que apareciam elevados nos lados não estavam ainda num estado de humildade alguma. E vi que a massa que se separava e os que não estavam humildes eram enviados de volta para o seu mundo, ao passo que os outros permaneciam.
38. Alguns espíritos de Mercúrio vieram a um certo espírito de nossa Terra que, quando vivia no mundo, fora muito celebrado pela sua erudição (era Cristian Wolff), desejando serem informados por ele a respeito de várias coisas. Mas, quando perceberam que o que dizia não era elevado acima dos sentidos do homem natural, pois, quando falava, ele pensava em honra e que queria, como no mundo (pois cada um na outra vida é semelhante ao que foi nesta), juntar várias coisas em séries e dessas coisas concluir outras de novo e continuadamente, e assim, de tais coisas conectar muitas mais que eles não viam ou não reconheciam como verdades, dizendo que assim os elos não tinham ligação nenhuma por si e nem mesmo com as conclusões, e chamando-as de escuridão da autoridade, aí então desistiram de lhe pedir suas opiniões, indagando somente como isso ou aquilo se chamava: e como ele também respondia por meio de ideias materiais e por nenhuma ideia espiritual, afastaram-se dele, pois cada um na outra vida fala espiritualmente ou por ideias espirituais na medida que no mundo acreditou em Deus e, materialmente, na medida que não acreditou.
[2] Visto que aqui há uma oportunidade, é permitido relatar o que se passa na outra vida com os eruditos que adquirem inteligência de uma própria meditação abrasada pelo amor de saber as verdades por causa das verdades; assim, por causa dos usos abstraídos das coisas mundanas; e com os eruditos que adquirem inteligência de outros, sem a própria meditação, como costumam fazer os que desejam saber as verdades unicamente por causa da fama de erudição e da honra ou lucro dela provenientes no mundo; assim, não por causa dos usos abstraídos das coisas mundanas. É permitido incluir aqui uma certa experiência sobre isso. Uma espécie de som foi percebida, penetrando debaixo ao longo do lado esquerdo até a orelha esquerda. Notei que eram espíritos que, ali, faziam esforços para subir, mas não pude saber quais eram. No entanto, quando subiram, falaram comigo explicando que tinham sido lógicos e metafísicos, e tinham mergulhado seus pensamentos em tais coisas, sem outro fim senão o de serem chamados eruditos e, assim, alcançarem honras e riquezas, lamentando que agora levavam uma vida miserável, porque tinham adquirido essas coisas sem qualquer outro fim e, assim, não cultivaram a sua faculdade racional por meio delas. A sua fala era lenta e emitia um som surdo. Enquanto isso, dois deles falavam entre si acima de minha cabeça; e, como eu perguntava quem eram, foi-me informado que um deles era alguém muito famoso no mundo sábio, e foi-me feito crer que fosse Aristóteles; quanto ao outro, não me foi dito quem era. Então, o primeiro foi levado ao estado em que estava quando vivia no mundo, pois cada um pode facilmente ser levado ao estado da vida em que esteve no mundo, porque possui consigo cada estado de sua vida. Todavia, o que me surpreendeu foi que ele se aproximava da minha orelha direita e ali falava, mas num tom de voz rouco e, contudo, de maneira sensata. Pelo conteúdo de suas palavras, percebi que era de uma natureza completamente diferente da dos escolásticos que tinham subido antes, e isso porque concebera de seu pensamento as coisas que escrevera e delas concebera a sua filosofia, de modo que os termos que inventara e que impusera às coisas de seu pensamento eram sistemas de palavras pelos quais descrevia coisas interiores; depois, porque fora estimulado a tais coisas pelo prazer da afeição e pelo desejo de saber o que tinha relação ao pensamento e ao entendimento; e, também, porque seguira com obediência o que seu espírito lhe ditara. Por isso se aproximava da orelha direita, diferentemente de seus seguidores, os chamados escolásticos, que vão, não do pensamento aos termos, mas dos termos aos pensamentos, assim, pelo caminho oposto; e a maior parte desses nem mesmo chega aos pensamentos, mas se detêm somente nos termos; e, se os usam, é para confirmar tudo o que querem e para dar às falsidades uma aparência de verdade, segundo o seu desejo de persuadir. Daí, para eles, as coisas filosóficas são meios de se tornarem insensatos, em vez de meios de se tornarem sábios; e, por isso, têm a escuridão no lugar da luz.
[3] Em seguida lhe falei da ciência analítica, explicando-lhe que uma criancinha, em meia hora, fala com mais filosofia, análise e lógica, que ele mesmo poderia descrever em um volume. E isso, porque todas as coisas que pertencem ao pensamento e, por conseguinte, à linguagem humana são analíticas, cujas leis são provenientes do mundo espiritual. E, também, que a pessoa que tentar, de um modo artificial, pensar a partir de termos, não difere de um dançarino que tentasse aprender a dançar a partir de seu conhecimento de fibras motoras e músculos; se a sua mente se detivesse nesses conhecimentos, quando dançasse, mal poderia, então, mover o pé! No entanto, sem esse conhecimento, o dançarino move todas as fibras motoras espalhadas ao redor de todo o seu corpo e, com precisão, os pulmões, o diafragma, os flancos, os braços, o pescoço e todas as outras partes, cuja descrição preencheria miríades de volumes. E acontece da mesma forma com os que querem pensar a partir de termos. Ele aprovou essas observações, dizendo que, se se aprende a pensar por esse caminho, procede-se em ordem inversa; ajuntando que, se alguém quiser se tornar insensato, deve proceder dessa maneira; mas, se desejar o contrário, deve pensar continuamente sobre o uso, e, assim, a partir do que é interior. Em seguida me mostrou que ideia tivera do Deus Supremo, isto é, que O imaginara consigo com uma face humana, e rodeado por um círculo radiante ao redor da cabeça; e agora sabia que o Senhor é Ele mesmo aquele Homem, e o círculo radiante é a Divindade que procede d’Ele e que influi não somente no céu, mas também no universo, e os dispõe e governa, ajuntando que quem dispõe e governa o céu, também dispõe e governa o universo, porque um não pode ser separado do outro. Disse-me também que acreditou em um único Deus, cujos atributos e qualidades se tornaram notáveis por tantos nomes quantos outros adoraram como deuses. Vi, então, uma mulher que estendia a mão, querendo tocar levemente a minha face; como eu me admirasse disso, ele falou que, quando estava no mundo, vira muitas vezes uma mulher semelhante, que, por assim dizer, lhe tocava levemente a face e sua mão era bela. Os espíritos angélicos explicaram que tais mulheres foram algumas vezes vistas pelos antigos e chamadas de Palas; e ela lhe apareceu por causa dos espíritos que, quando viviam com pessoas nos tempos antigos, se deleitavam com ideias e se entregavam a pensamentos, mas sem a filosofia; e, como tais espíritos estavam em associação com ele e nele se compraziam porque ele pensava a partir do que era interior, exibiam, então tal mulher de modo representativo. Por fim, declarou que ideia tivera da alma ou espírito do ser humano, que denominara "pneuma", a saber, que era um ser vivente invisível, como se fosse algo etéreo; e sabia que seu espírito viveria após a morte porque era sua essência interior que não pode morrer, visto que é capaz de pensar. E, além disso, que não pudera pensar claramente sobre o "pneuma", mas somente de um modo obscuro porque a seu respeito não tivera conhecimento algum, a não ser de si mesmo e um pouco também dos antigos. De resto, Aristóteles se encontra na outra vida entre os espíritos sensatos, e um grande número de seus seguidores entre os insensatos.
39. Um dia vi que espíritos da nossa Terra estavam junto dos espíritos do planeta Mercúrio e os ouvia conversarem entre si, e, então, entre outras coisas, os espíritos da nossa Terra perguntavam-lhes em quem acreditavam. Responderam que acreditavam em Deus; mas, quando eles perguntaram ainda mais sobre o Deus em que acreditavam, não quiseram falar mais a esse respeito, porque é seu hábito não responder diretamente a perguntas. Então, os espíritos do planeta Mercúrio, por sua vez, perguntaram aos espíritos da nossa Terra em quem eles criam; estes responderam que era no Senhor Deus; mas, nisso, os espíritos de Mercúrio replicaram que percebiam que eles não criam em Deus algum, e que tinham por hábito falar de boca que creem, quando, no entanto, não creem (os espíritos de Mercúrio têm uma percepção apurada e isso porque examinam continuamente, por meio da percepção, o que os outros sabem). Os espíritos de nossa Terra estavam entre aqueles que, no mundo, professaram a fé, segundo a doutrina da igreja; contudo, ainda assim não viveram a vida da fé e os que não vivem a vida da fé, na outra vida não possuem a fé, porque esta não está na pessoa([18]). Quando ouviram isso, guardaram silêncio, porque reconheceram por uma percepção que lhes foi, então, dada, que isso era assim, de fato.
40. Alguns espíritos sabiam, do céu, que certa vez fora prometido aos espíritos de Mercúrio que eles veriam o Senhor. Em consequência, foi-lhes perguntado pelos espíritos que estavam ao meu redor, se eles se recordavam dessa promessa; responderam que se recordavam, mas que não sabiam se isso lhes tinha sido prometido de tal modo que não pudesse haver nenhuma dúvida a esse respeito. Enquanto conversavam assim entre si, o Sol do céu apareceu-lhes (o Sol do céu, que é o Senhor, não é visto senão pelos que estão nos céus mais interiores ou terceiro céu; os outros veem a luz que dele procede). Ao verem o Sol, disseram que aquele não era o Senhor Deus, porque não viam a Sua face. Mas nesse meio tempo, os espíritos conversavam entre si, porém eu não escutava o que diziam. Todavia, de repente, o Sol apareceu de novo e, no meio dele, o Senhor rodeado por um círculo solar; ao vê-Lo, os espíritos de Mercúrio tornaram-se humildes, profundamente, e prostraram-se. Então, o Senhor também foi visto daquele Sol por espíritos desta Terra que, quando tinham vivido como pessoas, O viram no mundo; e eles professaram, um após outro, e, assim, vários em sucessão, que Aquele era o Senhor; e confirmaram isto diante de todo o grupo. Então, o Senhor foi ainda visto desse Sol por espíritos do planeta Júpiter, que declararam em alta voz que aquele era o Mesmo que tinham visto na sua terra, quando o Deus do universo lhes apareceu([19]).
41. Alguns, depois que o Senhor fora visto, foram conduzidos para as partes anteriores no lado direito e, enquanto andavam, diziam que viam uma luz, muito mais clara e pura que qualquer das que tinham visto antes, e que jamais seria possível ver uma luz maior; era, então, o cair da tarde e os que diziam isso eram muitos([20]).
42. É preciso que se saiba que o sol do mundo absolutamente não aparece a espírito algum, nem coisa alguma da luz que dele procede; a luz desse sol é para os espíritos e anjos como uma escuridão densa; esse sol permanece com os espíritos somente na percepção, em razão do que viram quando estavam no mundo, e apresenta-se a eles na ideia como algo obscuro, e isso, por detrás, a uma distância considerável, numa altura um pouco acima do nível da cabeça. Os planetas que se encontram dentro do sistema solar desse sol aparecem segundo uma certa posição em relação ao sol: Mercúrio por detrás, um pouco para a direita; o planeta Vênus à esquerda, um pouco para trás; o planeta Marte para a esquerda, pela frente; o planeta Júpiter, igualmente para a esquerda e pela frente, mas a uma distância maior; e o planeta Saturno inteiramente na frente, a uma distância considerável; a Lua para a esquerda, bastante elevada; os satélites também à esquerda, em relação a seu planeta. Tal são as posições desses planetas nas ideias dos espíritos e dos anjos; e, além disso, os espíritos aparecem próximo de seu planeta, no seu exterior. Quanto ao que concerne especialmente aos espíritos de Mercúrio, eles aparecem, não em uma determinada região, nem a uma certa distância, mas ora em frente, ora à esquerda, ora um pouco atrás, e isso porque lhes é permitido percorrer o Universo, para adquirirem conhecimentos.
43. Um dia uns espíritos de Mercúrio apareceram pela esquerda num globo, que, em seguida, estendeu o seu volume em comprimento; e eu fiquei a pensar aonde queriam ir, se era para esta Terra ou para outro lugar; e logo notei que se desviavam para a direita e que, revolvendo-se, aproximavam-se da terra ou planeta Vênus, pela sua região frontal. Mas, quando ali chegaram, disseram que não queriam permanecer ali porque os habitantes eram maus; por isso se dirigiram para a parte posterior dessa terra e, então disseram que ali queriam se demorar, porque os que ali habitavam eram bons. Enquanto isso se sucedia, eu sentia uma transformação notável no cérebro, e uma forte atividade que disso resultava. Disso, é possível concluir que os espíritos de Vênus, que são dessa parte do planeta, harmonizavam-se com os espíritos de Mercúrio e que aqueles representam a memória das coisas materiais, que se harmoniza com a memória das coisas imateriais, a qual os espíritos de Mercúrio representam. Daí a atividade mais forte que fora sentida oriunda deles quando estavam lá.
44. Eu desejava saber que face e corpo têm as pessoas do planeta Mercúrio, ou seja, se são semelhantes às pessoas da nossa Terra. Então, foi apresentada diante de meus olhos uma mulher inteiramente semelhante às que existem na Terra; sua face era bela, mas um pouco menor que a das mulheres de nossa Terra; era também mais magra de corpo, contudo de mesma altura; sua cabeça estava coberta por um pano de linho sem muito enfeite, mas ainda assim de boa aparência. Também, me foi mostrado um homem que, da mesma forma, era mais magro de corpo do que os homens de nossa Terra; ele vestia uma roupa azul escuro, ajustada bem junto ao corpo, sem pregas nem saliências de qualquer lado. Foi dito que as pessoas dessa terra eram assim, quanto à forma e à vestimenta do corpo. Em seguida, foram apresentadas as espécies de seus bois e vacas que, é verdade, não diferiam muito das espécies de nossa Terra, mas que eram menores e aproximavam-se, de certo modo, de uma espécie de cervas e cervos.
45. Eles também foram indagados sobre o sol do mundo, como ele aparecia em sua terra. Responderam que é grande, e que lá aparece maior que em outras terras; disseram que sabiam isso pela ideia que os outros espíritos tinham do sol. Acrescentaram que gozam de um clima temperado: nem muito quente, nem muito frio; foi-me, então, permitido dizer que assim lhes fora provido pelo Senhor, para que não recebessem calor em excesso, pelo fato de sua terra estar mais perto do sol que as outras; porquanto o calor vem, não da proximidade do sol, mas da altitude e da densidade da atmosfera aérea, como se pode ver pelo frio nas montanhas altas, até mesmo em climas quentes; e também porque o calor varia segundo a incidência reta ou oblíqua dos raios do sol como se vê claramente pelas estações de inverno e de verão em cada região. Estas são as coisas que me foram permitidas saber sobre os espíritos e sobre os habitantes da terra de Mercúrio.
Dos ARCANOS CELESTES, em que as coisas contidas nestas notas e nas que se seguem foram explicadas e mostradas:
[1] Não existem espíritos nem anjos que não provenham do gênero humano. No 1880.
[2] Os espíritos de cada terra estão próximos de sua terra, e isso porque provêm dos habitantes e são semelhantes a eles em índole; e que devem ser-lhes úteis. No 9968.
[3] A alma, que vive após a morte, é o espírito do ser humano, o que é, no ser humano, o próprio ser humano, e aparece também na outra vida em perfeita forma humana. Nos 322, 1880, 1881, 3633, 4622, 4735, 6054, 6605, 6626, 7021 e 10594.
[4] O ser humano, também quando está no mundo, quanto a seus interiores, assim, quanto ao espírito ou a alma, está no meio de espíritos e anjos que são tais como ele mesmo é. Nos 2379, 3645, 4067, 4073, 4077.
[5] O ser humano pode falar com os espíritos e os anjos e os antigos na nossa Terra frequentemente falavam com eles. Nos 67-69, 784, 1634, 1636 e 7802. Mas atualmente é perigoso falar com eles, a menos que a pessoa esteja na fé verdadeira e seja guiada pelo Senhor. Nos 784, 9438, 10751.
[6] O céu corresponde ao Senhor, e o ser humano, quanto a toda e cada uma de suas coisas, corresponde ao céu e, por conseguinte, o céu, perante o Senhor, é um ser humano em grande efígie, e deve ser chamado o Máximo Homem. Nos 2996, 2998, 3624-3649, 3741-3745, 4625. Sobre a correspondência do ser humano e de todas as suas partes com o Máximo Homem, que é o céu, em suma, ver o que lá está pelos próprios acontecimentos relatados. Nos 3021, 3624-3649, 3741-3750, 3883-3896, 4039-4051, 4218-4228, 4318-4331, 4403-4421, 4527-4533, 4622-4633, 4652-4660, 4791-4805, 4931-4953, 5050-5061, 5171-5189, 5377-5396, 5552-5573, 5711-5727, 10030.
[7] Os habitantes de todas as terras adoram o Divino sob a forma humana, assim o Senhor. Nos 8541-8547, 10159, 10736-10738. E se alegram quando ouvem dizer que Deus se fez realmente Homem. No 9361. Não se pode pensar a respeito de Deus, senão na forma humana. Nos 4733, 5110, 5663, 7211, 10067, 10267.
[8] O Senhor recebe todos os que estão no bem, e que adoram o Divino sob a forma humana. Nos 7173, 9359.
[9] Os espíritos entram em todas as coisas da memória da pessoa, mas não pela sua própria memória nas coisas do homem. Nos 2488, 5863, 6192, 6193, 6198, 6199, 6214. Os anjos entram nas afeições e nos fins pelos quais e por causa dos quais a pessoa pensa, quer e age de uma maneira e não de outra. Nos 1317, 1645, 5854.
[10] Os espíritos de cada terra estão próximos de sua terra, e isso porque provêm dos habitantes e são semelhantes a eles em índole; e que devem ser-lhes úteis. No 9968.
[11] Os espíritos que estão com o homem estão em posse de todas as coisas de sua memória. Nos 5853, 5857, 5859, 5860.
[12] Nos céus há uma comunicação de todos os bens, porque o amor celeste comunica aos outros tudo o que lhe pertence; e é disso que os anjos têm sabedoria e felicidade. Nos 549, 550, 1390, 1391, 1399, 10130, 10723.
[13] O olho corresponde ao entendimento, porque o entendimento é a visão interior de coisas imateriais. Nos 2701, 4410, 4526, 9051, 10569. A visão do olho esquerdo corresponde às verdades, assim como à inteligência, e a visão do olho direito aos bens da verdade, assim, à sabedoria. No 4410.
[14] A vida de cada um permanece com ele e o segue após a morte. Nos 4227, 7439. Os exteriores da vida são mantidos fechados após a morte, e os interiores da vida são abertos; Nos 4314, 5128, 6495. Então, toda e cada uma coisa que pertence ao pensamento se manifesta. Nos 4633, 5128.
[15] As aves simbolizam coisas racionais, coisas intelectuais, pensamentos, ideias e conhecimentos. Nos 40, 745, 776, 778, 866, 988, 991, 5149, 7441. E isso como variedade, segundo o gênero e a espécie das aves. Nos 3219
[16] As lanternas com velas simbolizam as verdades que brilham do bem. Nos 4638, 9548, 9783.
[17] Os cordeiros no céu e na Palavra simbolizam a inocência. Nos 3994, 7840, 10132.
[18] Aqueles que professam a fé segundo a doutrina e não vivem a vida da fé, não possuem fé alguma. Nos 3865, 7766, 7778, 7790, 7950, 8094. E seus interiores estão opostos às verdades da fé, embora não saibam isso no mundo. Nos 7790, 7950.
[19] O Senhor é o sol do céu; e lá, toda luz procede desse sol. Nos 1053, 3636, 4060. E o Senhor aparece assim aos que estão no Seu reino celestial, onde reina o amor para com Ele. Nos 1521, 1529, 1530, 1531, 1837, 4696. Aparece a meia altura acima do nível do olho direito. Nos 4321, 7078. Por isso, na Palavra, o sol simboliza o Senhor quanto ao Divino Amor. Nos 2495, 4060, 7083. O sol do mundo não aparece aos espíritos nem aos anjos, mas em seu lugar aparece algo como se fosse tenebroso, por detrás e em posição oposta ao sol do céu, ou seja, ao Senhor. Nos 9755.
[20] Nos céus há uma grande luz, que ultrapassa em alto grau a luz do meio-dia na Terra. Nos 1117, 1521, 1532, 1619-1632, 4527, 5400, 8644. Toda luz nos céus vem do Senhor como o sol de lá. Nos 1053, 1521, 3195, 3341, 3636, 3643, 4415, 9548, 9684, 10809. A Divina Verdade procedente do Divino Bem do Divino Amor do Senhor aparece nos céus como luz, e lá constitui toda luz. Nos 3195, 3222, 5400, 8644, 9399, 9548, 9684. A luz do céu ilumina tanto a visão quanto o entendimento dos Anjos. Nos 2776, 3138. Se é dito que o céu está na luz e no calor, isso simboliza que está na sabedoria e no amor. Nos 3643, 9400, 9402.