O Cavalo Branco

De que se trata no Apocalipse

* * * * * * *

Emanuel Swedenborg

 

O Cavalo Branco

de que se trata no Apocalipse, capítulo 19

 

1.         Em João, a Palavra quanto ao sentido espiritual ou interno é assim descrita no Apocalipse:

“Vi o céu aberto, e eis, um cavalo branco, e Aquele que estava assentado sobre ele chama-se Fiel e Verdadeiro, e em justiça julga e combate. Seus olhos, como uma chama de fogo, e sobre a Sua cabeça, muitos diademas; tendo um nome escrito que ninguém conhece senão Ele Mesmo, e trajando uma vestimenta tinta de sangue; e chama-se o Seu nome: A Palavra de Deus. E os exércitos que estão nos céus O seguiam sobre cavalos brancos, vestidos de fino linho branco e limpo. E tem, sobre a Sua vestimenta e sobre a Sua coxa, um nome escrito: Rei dos reis e Senhor dos senhores” (Ap. 19:11-14, 16).

O que cada uma dessas coisas encerra só é possível saber pelo sentido interno. É evidente que todas, sem exceção, são representativas e significativas, a saber, o ‘céu aberto’, o ‘cavalo branco’, ‘Aquele que estava montado sobre ele julgando e combatendo em justiça’, ‘Seus olhos como uma chama de fogo’, ‘muitos diademas sobre a Sua cabeça’, o ‘nome que ninguém conhece exceto Ele’, a ‘vestimenta tinta de sangue’ que Ele trajava, os ‘exércitos que estão nos céus e que O seguiam sobre cavalos brancos, vestidos de linho branco e limpo’, e o ‘nome escrito sobre a Sua vestimenta e sobre a Sua coxa’. Diz-se claramente que é a Palavra e que o Senhor Mesmo é a Palavra, porquanto se diz: ‘Seu nome se chama a Palavra de Deus’, e, depois: ‘Ele tem, sobre a Sua vestimenta e sobre a Sua coxa, um nome escrito: Rei dos reis e Senhor dos senhores’. Pela interpretação de cada vocábulo é evidente que aqui a Palavra é descrita quanto ao sentido espiritual ou interno. O ‘céu aberto’ representa e significa que o sentido interno da Palavra é visto no céu e, por conseguinte, por aqueles no mundo para os quais o céu é aberto. O ‘cavalo’, que é branco, representa e significa o entendimento da Palavra quanto aos seus interiores. Que o ‘cavalo’ tenha essa significação ver-se-á na sequência. ‘Aquele que estava montado’ nele é o Senhor quanto à Palavra, assim, a Palavra, coisa que é evidente, e por isso se diz: ‘Seu nome se chama a Palavra de Deus’. Por causa do bem Ele é chamado ‘Fiel, que julga em justiça’, e por causa do vero é chamado ‘Verdadeiro, que combate em justiça’, porque o Senhor mesmo é a Justiça. ‘Seus olhos como uma chama de fogo’ significam o Divino Vero proveniente do Divino Bem de Seu Divino Amor. ‘Sobre a Sua cabeça muitos diademas’ significa todos os bens e todos os veros da fé. ‘Tendo um Nome escrito que ninguém conhece senão Ele mesmo’ significa que nenhum outro, exceto Ele e aquele a quem Ele o revela, vê qual é a Palavra no sentido interno. ‘Trajando uma vestimenta tinta de sangue’ significa a Palavra na letra, à qual se fez violência. Os ‘exércitos nos céus, que O seguiam sobre cavalos brancos’ significam os que estão no entendimento da Palavra quanto aos interiores. ‘Vestidos de fino linho branco e limpo’ significa os mesmos no vero do bem. O ‘nome escrito sobre a Sua vestimenta e sobre a Sua coxa’ significa o bem e o vero, e a sua qualidade. Por estas coisas e pelas que precedem e as que seguem é evidente que aí se prediz que no último tempo da igreja o sentido espiritual ou interno da Palavra será aberto, e o que deve então suceder também está escrito ali, nos versículos 17 a 21. Que tais coisas sejam significadas por essas palavras não há necessidade de se mostrar aqui, pois cada uma dessas coisas foi mostrada nos Arcanos Celestes, por exemplo: Que o Senhor seja a Palavra, porque Ele é o Divino Vero,  n. 2533, 2803, 2894, 5272 e 7678. Que a Palavra seja o Divino Vero,  n. 4692, 5075 e 9987. Que seja dito que Ele estava ‘montado sobre um cavalo, julgando e combatendo em justiça’ é porque o Senhor é a Justiça; que o Senhor seja chamado ‘Justiça’ é porque Ele salvou o gênero humano por Seu próprio poder,  n. 1813, 2025, 2027, 9715, 9809, 10019 e 10152; e que a Justiça seja o Mérito que pertence ao Senhor, só,  n. 9715 e 9979. Que ‘os olhos como uma chama de fogo’ signifiquem o Divino Vero que vem do Divino Bem do Divino Amor é porque os olhos significam o entendimento e o vero da fé,  n. 2701, 4403 a 4421, 4523 a 4534, 6923, 9051 e 10569; e a chama de fogo, o bem do amor,  n. 934, 4906, 5215, 6314 e 6832. Que ‘os diademas’ que estavam sobre a Sua cabeça signifiquem todos os bens e todos os veros da fé,  n. 114, 3858, 6335, 6640, 9863, 9865, 9868, 9873 e 9905.  Que ‘tendo um nome escrito que ninguém conhece senão Ele mesmo’ signifique que nenhum outro senão o Senhor, e aquele a quem Ele o revela, vê qual é a Palavra no sentido interno é porque o ‘Nome’ significa a qualidade da coisa,  n. 144, 145, 1754, 1896, 2009, 2724, 3006, 3237, 3421, 6674 e 9310. Que ’trajando uma vestimenta tinta de sangue’ signifique a Palavra na letra, à qual se fez violência, é porque a vestimenta significa o vero que reveste o bem,  n. 1073, 2576, 5248, 5319, 5954, 9212, 9216, 9952 e 10536, mormente o vero nos últimos; por conseguinte, a Palavra na letra,  n. 5248, 6918, 9158 e 9212; e porque o ‘sangue’ significa a violência feita ao vero pelo falso,  n. 374, 1005, 4735, 5476 e 9127. Que os ‘exércitos nos céus O seguiam sobre cavalos brancos’ signifique os que estão no entendimento da Palavra quanto aos interiores é porque os ‘exércitos’ significam os que estão nos veros e nos bens do céu e da igreja,  n. 3448, 7236, 7988 e 8019; o ‘cavalo’, o entendimento,  n. 3217, 5321, 6125, 6400, 6534, 7024, 8146 e 8381; e o ‘branco’, o vero que está na luz do céu, por conseguinte, o vero interior,  n. 3301, 3993, 4007 e 5319. Que os ‘vestidos de fino linho branco e limpo’ signifiquem os mesmos no vero segundo o bem é porque o ‘fino linho’ ou o estofo de linho significa o vero de origem celeste, isto é, o vero procedente do bem,  n. 5319 e 9469. Que o ‘nome escrito sobre a Sua vestimenta e sobre a Sua coxa’ signifique o vero e o bem, e a sua qualidade, é porque a ‘vestimenta’ significa o vero, o ‘nome’ significa a qualidade, como observado acima, e a ‘coxa’ significa o bem do amor,  n. 3021, 4277, 4280, 9961 e 10488. Que ‘Rei dos reis e Senhor dos senhores’ seja o Senhor quanto ao Divino Vero e quanto ao Divino Bem; que o Senhor seja chamado ‘Rei’ por causa do Divino Vero,  n. 3009, 5068 e 6148; e seja chamado ‘Senhor’ por causa do Divino Bem,  n. 4973, 9167 e 9194.  Sendo assim, vê-se qual é a Palavra no sentido espiritual ou interno, e que nela não há vocábulo algum que não signifique algo espiritual, isto é, alguma coisa pertencente ao céu e à igreja.

2.         Nas partes proféticas da Palavra o cavalo é nomeado muitas vezes, mas, até agora, ninguém soube que o ‘cavalo’ significa o entendimento, e o ‘cavaleiro’ significa o inteligente, e isso, talvez, porque pareça estranho e surpreendente que tal seja a significação do cavalo no sentido espiritual e, por conseguinte, na Palavra. A verdade, porém, é que se pode ver que isso é assim por muitas passagens, das quais referirei aqui somente as que se seguem. Na profecia de Israel a respeito de Dan:

“Dan [será] uma serpente sobre o caminho, uma serpente voadora sobre a vereda, que morde os calcanhares do cavalo, e o seu cavaleiro cairá para trás” (Gn. 49:17, 18).

O que significa essa profecia sobre uma das tribos de Israel ninguém compreenderá, exceto se souber o que é significado pela ‘serpente’, depois, o que é significado pelo ‘cavalo’ e pelo ‘cavaleiro’. Ninguém ignora que é um espiritual que está aí encerrado. O que é significado por cada uma dessas expressões pode-se ver nos Arcanos Celestes,  n. 6398 a 6401, onde essa profecia é explicada. Em Habacuque:

“Deus, cavalgas sobre Teus cavalos. Teus carros [são] a salvação; fizeste pisar o mar pelos Teus cavalos” (Hb. 3:8, 15).

Que aí os ‘cavalos’ signifiquem algo espiritual é evidente pelo fato de tais coisas se dizerem a respeito de Deus; de outro modo, que poderiam significar essas palavras, que ‘Deus cavalga sobre Seus cavalos, e que Ele faz pisar o mar por Seus cavalos?’ Em Zacarias:

“Naquele dia, haverá sobre as campainhas dos cavalos: Santidade a Jehovah” (Zc. 14:20);

e, semelhantemente, no mesmo:

“Naquele dia, palavra de Jehovah, ferirei todo cavalo de espanto, e seu cavaleiro de desvario, e sobre a casa de Jehovah abrirei os Meus olhos, e todo cavalo dos povos ferirei de cegueira” (Zc. 12:4-5).

Aí se trata da devastação da igreja, que acontece quando não há mais entendimento algum de vero. Isto é descrito assim pelo ‘cavalo’ e pelo ‘cavaleiro’; de outro modo, o que significaria ‘ferir de espanto todo cavalo e de cegueira todo cavalo dos povos’? Que teria isso a ver com a igreja? Em :

“Deus a privou de sabedoria e não lhe deu entendimento; a seu tempo ela se levanta ao alto; ri-se do cavalo e do que vai montado nele” (Jó 39:17, 18, 19 e seq.).

Que pelo ‘cavalo’ aí seja significado o entendimento é claramente evidente; o mesmo sucede em David, onde se diz:

“Cavalga sobre a palavra da verdade” (Sl.  45:5);

além de muitos outros lugares. Ainda mais, quem poderá saber de onde vem que Elias e Eliseu foram chamados de ‘carros de Israel e seus cavaleiros’, e por que motivo o criado de Eliseu viu uma montanha repleta de cavalos e de carros de fogo, se não souber o que significam os ‘carros’ e os ‘cavaleiros’, e o que Elias e Eliseu representaram? Pois Eliseu disse a Elias:

“Meu pai, meu pai, carros de Israel e seus cavaleiros!” (2 Re. 2:11-12).

E o rei Joás disse a Eliseu:

“Meu pai, meu pai, carros de Israel e seus cavaleiros!” (2 Re. 13:14).

E, a respeito do menino de Eliseu, foi dito que

Jehovah abriu os olhos do menino de Eliseu, e ele viu, e eis, a montanha repleta de cavalos e de carros de fogo ao redor de Eliseu” (2 Re. 6:17).

Que Elias e Eliseu tenham sido chamados de ‘carros de Israel e seus cavaleiros’ foi porque um e outro representaram o Senhor quanto à Palavra, os carros significam a doutrina segundo a Palavra, e os ‘cavaleiros’ a inteligência. Que Elias e Eliseu tenham representado o Senhor quanto à Palavra pode-se ver nos Arcanos Celestes, n. 5247, 7643, 8029 e 9327; depois também, que os carros signifiquem a doutrina da Palavra, nos n. 5321 e 8215.

3.         Que o cavalo signifique o entendimento, isso não vem de outra parte senão dos representativos no mundo espiritual. Ali aparecem muitas vezes cavalos e cavaleiros, e também carros, e todos ali sabem que eles significam as coisas intelectuais e doutrinais. Quando alguns espíritos ali pensavam segundo seu entendimento, vi muitas vezes que eles apareciam como que montando cavalos; assim se representava a sua meditação perante os outros, sem que eles o soubessem. Há, também, ali, um lugar onde se reúnem em grande número os que pelo entendimento pensam e falam a respeito dos veros da doutrina, e quando outros lá entram, eles veem toda aquela planície cheia de carros e cavalos. E os noviços, que se surpreendem por isso, são instruídos que essa aparência vem do pensamento intelectual dos que lá estão. Esse lugar se chama Assembleia dos Inteligentes e dos Sábios. Vi, também ali, cavalos reluzentes e carros de fogo, quando alguns [espíritos] foram arrebatados ao céu, o que era um indício de que então eles tinham sido instruídos nos veros da doutrina celeste e se tornaram inteligentes, sendo, assim, arrebatados. Vendo isso, acudiu-me ao espírito o que foi significado pelo ‘carro de fogo’ e pelos ‘cavalos de fogo’ com que Elias foi arrebatado ao céu, e o que foi significado pelos ‘cavalos’ e pelos ‘carros de fogo’ vistos pelo menino de Eliseu, quando seus olhos foram abertos.